Tal nulidade, de conhecimento oficioso, implica a invalidade daquele despacho de encerramento do inquérito proferido pelo MP, e bem assim de todo o processado subsequente.
Neste sentido se pronunciou o Ac. TRL de 7-4-2010, assim sumariado:
I. Tendo os factos ocorrido na escola pública onde a ofendida é professora, sendo que as expressões em causa foram proferidas no decurso de uma reunião com os encarregados de educação de uma turma que aquela leccionava, os mesmos integram o crime de injúrias agravado, p. e p., pelas disposições combinadas dos artºs 181º, nº1 e 184º, por referência à al.l) do nº2 do artº 132º, todos do Código Penal. Trata-se, pois, de um crime de natureza semi-pública (artº 188º, nº1, al.a) do CP).
II. No momento processual próprio o Ministério Público, ao invés de deduzir acusação, ordenou a notificação da assistente nos termos e para os efeitos do artº 285º, nº1 do CPP e, posteriormente, acompanhou a acusação particular por aquela deduzida que, incorrectamente, qualificou os factos como integrando o crime de injúrias simples p. e p. pelo artº 181º, nº1, do CP.
III. Acontece que: «Integra a nulidade insanável da alínea b) do artº 119º do CPP a adesão posterior do Ministério Público à acusação deduzida pelo assistente relativa a crimes de natureza pública ou semi-pública e fora do caso previsto no artº 284º, nº1, do mesmo diploma legal»? cfr. Assento nº1/2000, in DR Série I-A, de 6/1/2000.
IV. Isto porque, a ordem da sucessão das acusações do MP e do assistente é imperativa, surgindo, no tocante aos crimes públicos e semi-públicos, a deste necessariamente na sequência da acusação proferida por aquele e condicionada a esta (artº 284º, nºs 1 e 2). A subsequente adesão do MP à acusação do assistente não supre a nulidade decorrente da omissão inicial da acusação pública, tal como a acusação do Ministério Público em crime particular não sana a inexistência da acusação que deve ser formulada pelo assistente. Acresce que a lei, ao contrário do que dispõe relativamente aos crimes particulares (artº 284º, nº2, al.a), não prevê que a acusação pública possa limitar-se à adesão da acusação do assistente (artº 285º, nº3).
V. Assim sendo, está verificada a nulidade insanável da falta de promoção do processo pelo Ministério Público (artº 119º, al.b) do CPP) e, por via dela, a invalidade do despacho de arquivamento do inquérito e, bem assim, de todo o processado subsequente, voltando o processo à primeira instância para sanação do vício cometido.
Jurisprudência
1. Assento STJ nº1/2000, in DR, I Série A de 6-01-2000: Integra a nulidade insanável da al.b) do artº 119º do CPP a adesão posterior do Ministério Público à acusação deduzida pelo assistente relativa a crimes de natureza particular ou semipública e fora do caso previsto no artº 284º, nº1, do mesmo diploma legal.
2. Ac. STJ de 11-02-2010: mesmo as nulidades insanáveis, que a todo o tempo invalidam o acto em que foram praticadas e os actos subsequentes, ficam cobertas pelo trânsito em julgado da decisão, o que significa que, transitada em julgado a decisão, jamais podem ser invocadas ou oficiosamente conhecidas quaisquer nulidades, mesmo aquelas que a lei qualifica de insanáveis.
3. Quanto à alínea c): os tribunais superiores têm enquadrado a preterição de audição prévia do arguido (cfr. artº 495º, nº2 do CPP) como nulidade insanável e, por conseguinte, de conhecimento oficioso pelo tribunal, nos termos do disposto no artº 119º, alínea c) do CPP, vide: Ac. TRL de 1-03-2005, CJ, T2, pág.123; Ac. TRL de 10-02-2004; Ac. TRE de 18-01-2005 e Ac. TRP de 4-03-2009.
4. Quanto à alínea c): Ac. TRL de 30-06-2010, CJ, 2010, T3, pág.140: I. O conhecimento das nulidades, mesmo das insanáveis, não pode ter lugar a todo o tempo, mas enquanto permanecer a relação processual, não podendo ser declaradas uma vez transitada em julgado a decisão final. II. Face ao que estabelece o nº2 do artº 495º do CPP, é necessária a audição presencial do condenado antes de se decretar a revogação da suspensão da execução da pena, ou, ao menos, deve possibilitar-se essa audição presencial. III. A omissão da referida audição prévia integra a nulidade insanável cominada na alínea c) do artº 119º do CPP.
5. Ac. TRL de 30-06-2010, CJ, 2010, T3, pág.140: O conhecimento das nulidades, mesmo das insanáveis, não pode ter lugar a todo o tempo, mas apenas enquanto permanecer a relação processual, não podendo ser declaradas uma vez transitada em julgado a decisão final.
6. Ac. TRL de 17-02-2010, CJ, 2010, T1, pág.143: I. A falta de fundamentação de um despacho só gera nulidade nos casos como tal tipificados. II. Tendo o recorrente sido notificado pela PSP para ser inquirido no inquérito, numa altura em que já estava junta aos autos procuração a favor de advogada, esta devia ter sido notificada para estar presente, quanto mais não fosse a partir do momento em que a PSP interrompeu a inquirição, constituiu o recorrente como arguido, fê-lo prestar TIR e passou a tomar-lhe declarações nessa qualidade. III. Como não se tratava, porém, de nenhum caso em que fosse obrigatória a nomeação de defensor, o acto praticado não enferma de nulidade insanável prevista na alínea c) do artº 119º do CPP, padecendo de mera irregularidade.
7. Ac. TRL de 17-12-2008: O Ministério Público não deve abrir inquérito quando o comportamento denunciado não integra a prática de qualquer infracção criminal. II. Tendo o Ministério Público aberto inquérito, a não realização nele de qualquer diligência não constitui nulidade, sanável ou insanável.
III. Na fase de inquérito, o único acto legalmente obrigatório é o interrogatório do arguido, se se verificarem as circunstâncias previstas no n.º 1 do artigo 272.º do Código de Processo Penal, ou seja, se o inquérito correr contra pessoa determinada em relação à qual haja fundada suspeita da prática de crime e desde que seja possível notificá-la. IV. Num inquérito que não correu contra nenhuma pessoa determinada, não era obrigatório realizar qualquer interrogatório, razão pela qual não pode existir nulidade do inquérito, por insuficiência do mesmo, nos termos do disposto nos artigos 118.º, n.º 1, e 120.º, n.ºs 1, 2, al. d), e 3, al. c), do Código de Processo Penal
8. Ac. TRP de 2-05-2007, CJ, 2007, T3, pág.204: I. A notificação de arguido preso é requisitada ao director do respectivo estabelecimento prisional e feita na pessoa do notificando por funcionário designado para o efeito. II. Por isso, cometeu-se nulidade insanável se, achando-se o arguido preso, em vez de se requisitar a sua notificação para comparecer na audiência de julgamento, se remeteu aviso postal simples para a residência que, a par do estabelecimento prisional, constava do TIR, o que teve como consequência que ele não comparecesse na primeira sessão de julgamento, na qual foram inquiridas as testemunhas de acusação.
9. Quanto à alínea d): Ac. TRP de 9-05-2007, CJ, 2007, T3, pág.206: I. Como o inquérito tem por finalidade apurar se existe crime e quem o seu autor, não deve desenvolver-se actividade investigatória se os factos denunciados não puderem, notoriamente, constituir crime (designadamente porque foram descriminalizados), se o direito de queixa já caducou; ou se o procedimento criminal já se encontra extinto. II. Se, porém, não for evidente a falta de tipicidade dos factos denunciados, há o dever de os investigar. III. Em tal caso, se o MP profere despacho de arquivamento sem proceder a qualquer diligência, comete-se a nulidade insanável de falta de inquérito. Nota: é citado na decisão supra, em sentido concordante, o Ac. TRL de 12-02-2002, proferido no Proc. nº42319/00, 9ª secção, relatado por Margarida de Almeida, segundo o qual: Denunciado um determinado facto como crime, o MP não pode arquivar liminarmente os autos sem a realização de qualquer diligência, designadamente a identificação do arguido, sob pena de nulidade absoluta por falta de inquérito, pois o denunciado tem direito a ter conhecimento da queixa contra si apresentada e a pronunciar-se sobre ela, tal como ao denunciante deve ser dada a oportunidade de, caso a lei o permita, requerer a abertura da instrução.
10. Ac. TRL de 22-03-2007, Proc. 10718/06 9ª Secção,Desembargadores: Fernando Correia Estrela, Francisco Caramelo e Ribeiro Cardoso: A falta de audição prévia do arguido sobre a decisão que conheceu o objecto do recurso, proferida por simples despacho integra