— Agora você me quer? Qual é o seu jogo, Davina?
Ian ergueu as mãos em frustração e se arrastou até o centro da sala para defender seu caso, deixando Davina à porta.
— Não, não é isso que eu quero dizer, sabem bem disso! Por que você está tentando fazer minha família me ver como louca?
Ian deixou cair o queixo como se tivesse levado um tapa. Fechando a boca e depois os olhos, ele assentiu.
— Parlan, eu tentei. — ele olhou para o pai dela com tanta tristeza que a mãe soluçou. — Eu amo sua filha e esperava que pudéssemos fazer essa união funcionar, mas está claro que ela não vai me perdoar. — Virando-se para o pai, Munro, ele disse: — Vou ao meu quarto arrumar meu baú. É melhor partirmos amanhã. — de frente para Davina, ele deu um passo, ainda de costas para a sala, e abriu aquele sorriso particular e maligno que jamais era traído pela voz. — Adeus, Davina. — ele sussurrou, e partiu.
Munro o seguiu, mostrando uma carranca para ela ao sair.
Davina ficou perplexa com os olhares acusatórios de sua família. Parlan suspirou e marchou até a lareira, virando de costas para ela. Lilias soluçou no lenço que puxou da manga. Kehr deu um passo à frente, as sobrancelhas baixas.
— Davina, é hora de deixar de lado o amante cigano de seus sonhos. Nenhum homem, muito menos você Ian, será capaz de fazer jus a essa fantasia, jamais. Está na hora de crescer.
Parlan se virou com expressões fluidas que alternavam entre confusão e raiva. Davina quase se engasgou com o nó que se formou na garganta. Até seu amado Kehr a traía, pensava que ela estava louca! Correndo da sala, ela voltou para os estábulos. Puxando Heather da baia, Davina montou e disparou pelo terreno, saiu pelo portão da frente, para longe da loucura. Suas bochechas, molhadas de lágrimas, ficaram frias quando o vento soprou e emaranhou seus cabelos. Em uma clareira onde costuma conseguir encontrar a solidão, ela puxou as rédeas de Heather e saltou, caindo no chão coberto das folhas do outono passado, úmidas do orvalho da noite.
Ajoelhada no meio da floresta enluarada, Davina soluçava nas folhas. Quão certo estava seu amante cigano dos sonhos! A desgraça que Broderick previu para a vida dela quando ela era uma menina agora a dominava. E por que razão isso estava acontecendo? Ela só queria continuar a vida feliz que vivia antes de conhecer Ian. Por que Deus a uniu a este louco que se regozijava com a manipulação e o controle? Ela só queria uma família e alguém para amar. Com um impulso para se levantar, ela colocou as mãos trêmulas na barriga. Perder o primeiro filho provocara uma grande tristeza em seu ser, contudo, no fim não foi melhor ter perdido a criança? Davina não suportava ver sua própria carne e seu sangue obrigados a se submeter ao mesmo destino que ela, a esse frenesi que suportava. Curvando os joelhos contra o peito, ela puxou as pernas para perto, abraçando o bebê que se aninhava dentro dela. Ela perdera dois cursos mensais: um antes da punição de Ian e este último mês, portanto, engravidara antes que ela e Ian fossem colocados em quartos separados. O que aconteceria então a este bebê se a vissem como uma lunática? Balançando-se para frente e para trás, a testa apoiada nos joelhos, ela deixou o rio de lágrimas fluir.
A dobra de seu braço tocou a adaga que carregava na bota. Ela prendeu a respiração, congelada por uma ideia que tocou sua mente. Subindo a bainha do vestido, ela puxou a arma do esconderijo e sentou-se sobre os calcanhares. Seu coração guerreava devido a tal decisão.
Sou louca, mas que outra escolha me resta?
Ela apertou as mãos em torno do cabo da adaga, a ponta da lâmina posicionada na pele, na direção do coração. Com os nós dos dedos brancos e trêmulos, as mãos latejavam de dor. Se ela agarrava a faca por medo ou por força, não estava claro. Uma brisa suave tocou suas bochechas manchadas de lágrimas, esfriando a carne no ar da noite. Não queria chegar a este ponto, tirar a própria vida e a vida de seu filho ainda por nascer… mas como ela poderia enfrentar a loucura que os esperava? Como poderia enfrentar a traição da própria família? Ou era apenas uma desculpa covarde?
Ela soltou um grito de frustração e cravou a lâmina na terra úmida e macia, caindo no chão. Seu corpo se debatia com soluços e o cheiro de terra se misturava às folhas velhas e podres, como uma sepultura.
— Tão perto. — ela choramingou. — Tão perto de ser uma viúva. Tão perto da liberdade. Devido a uma decisão do rei, todas as esperanças dela se despedaçaram como pingentes de estalactites contra pedra. Até mesmo este membro de sua família, seu primo de sangue Real, a traiu. A aparição de James parecia ter sido enviada apenas a ela, apenas para atormentar sua existência. Davina soluçou mais forte enquanto a desesperança a engolfava.
Heather bateu com os cascos e sacudiu a cabeça. Davina lançou um olhar ao redor da floresta escura em busca da fonte da agitação do animal. Ela se sentiu revirar de medo.
Meu Deus! Haviam ido atrás dela?
Ela empalideceu.
Ian poderia tê-la perseguido… sozinho.
Exceto pelo leve farfalhar das árvores ao vento, apenas o silêncio sepulcral a rodeava. Ela perscrutou o terreno, mas não viu nada. Após mais um momento de silêncio, ela deu um suspiro hesitante e o alívio a banhou. Ninguém vinha com cavalos para agarrá-la e levá-la de volta. Davina pôs-se de pé, enxugou o nariz, e rastejou em direção à montaria, ainda olhando ao redor.
— Calma, calma. — ela apaziguou a égua com a mão estendida.
Antes que pudesse colocar os dedos no flanco de Heather, uma força invisível tirou o ar de seus pulmões, e ela bateu com a cabeça no chão. O rosto de Davina foi empurrado para as folhas, a cabeça latejando, e alguém esmagou seu corpo. Incapaz de respirar ou pensar, ela lutou para forçar o ar de volta aos pulmões quando o pânico se instalou.
— Relaxe, moça. — uma voz profunda sussurrou em seu ouvido. — Sua respiração voltará em um momento.
Em um giro, seu agressor a colocou de pé e a virou para encará-lo, as mãos dele apertavam os hematomas nos braços dela, feitos por Ian quando ele a segurou contra a parede dos estábulos. Com a visão turva e a mente ainda cambaleando com o encontro, ela conseguiu se equilibrar, e logo o ar da noite de verão encheu seus pulmões mais uma vez. Ela respirou em lufadas famintas.
— Aí está, moça.
Medo sacudiu seu corpo, e ela lutou com o homem que a mantinha presa contra ele. Um brilho como prata derretida nas pupilas dos olhos dele a atraiu para suas profundezas, e ela se acalmou. Uma onda de curiosidade e confusão a inundou quando o olhar dela pousou no rosto familiar, aquele nariz aquilino, aqueles olhos verde-esmeralda, os cabelos vermelho-fogo. Seu Broderick havia, por fim, voltado para resgatá-la? Ela empurrou o peito dele para ganhar alguma distância de seu rosto e ter uma melhor visão dele.
Não. Este rosto parecia mais jovem, a mandíbula não era tão larga, as maçãs do rosto não eram tão cinzeladas.
Eu perdi a cabeça!
Ela deveria estar apavorada a ponto de perder os sentidos nos braços de seu agressor, mas ainda assim se perguntava se ele era o homem por quem ansiava desde a juventude.
O perigo nos olhos dele se transformou em confusão quando o estranho escuro examinou o rosto dela. Agarrando-a pelos cabelos, ele puxou a cabeça dela para trás. Um grito escapou de seus lábios quando ele puxou o cabelo contra o caroço em sua cabeça. Ela foi forçada a ficar boquiaberta para o céu negro e a lua cheia acima. Ela prendeu a respiração quando a boca dele se fechou em sua garganta, e dentes afiados perfuraram a pele tenra. Uma breve dor… então um inesperado fluxo quente de prazer fluiu por suas veias, e ela desabou contra ele com um gemido, caindo em euforia.
Este homem — esta criatura — sondou sua mente, uma invasão sedutora em seus pensamentos, enquanto bebia, ele descobriu tudo que poderia ser desvendado. Em poucos instantes, ela reviveu os prazeres da infância, as frustrações da juventude e as fantasias com o amante cigano em seus sonhos. Essas memórias