A novela gráfica como género literário. Alexandra Dias. Читать онлайн. Newlib. NEWLIB.NET

Автор: Alexandra Dias
Издательство: Ingram
Серия:
Жанр произведения: Языкознание
Год издания: 0
isbn: 9783631820643
Скачать книгу
Tomaremos esta expressão, em sentido literal, como correspondente a narrativa longa em banda desenhada.

      ←24 | 25→

      «La littérature en estampes a ses avantages propres : elle admet, avec la richesse en détails, une extrême concision relative. (…) Elle a aussi cet avantage propre d’être d’intuition en quelque sorte, et, partant, d’une extrême clarté relative».

      Rodolph Töpffer

      Foi no inverno de 1830 que Frédéric Soret, tradutor de Métamorphose des Plantes, fez chegar a Johan Wolfgang von Goethe, pouco tempo antes da sua morte, dois manuscritos narrando as aventuras humorísticas de um colecionador de borboletas e de um cientista errático, ambos envolvidos em episódios burlescos e de refinado humor, o primeiro, pela constante fuga da sua autoproclamada noiva, e o segundo, por ser terrivelmente distraído. Os manuscritos, respetivamente L’Histoire de M. Cryptogame, 1830, e Voyages et Aventures du Dr. Festus, 1829, da autoria de um discreto professor, Rodolphe Töpffer, antigo colega e amigo de Soret, foram desenhados num estilo solto e irreverente, que rejeitava o ideal romântico de fusão perfeita entre homem e mulher e ridicularizava o clero, os militares e os homens da ciência48.

      Goethe encontrava-se em luto pela recente perda do seu filho. Eckermann, seu secretário à época, que tinha conhecido Töpffer no regresso de uma viagem a Itália, encoraja Soret a trazer alguns dos trabalhos apreciados por si em casa do autor. Os divertidos diários de viagem e as histórias desenhadas plenas de humor pareciam o ideal para distrair o solitário octogenário49. Apesar de conservador e da sua antipatia para com os cultores da caricatura, Goethe apreciava estes pequenos álbuns que designava por «romances em caricaturas»50:

      ←25 | 26→

      Rodolphe Töpffer, Histoire de Mr. Jabot, 1833.

      ←26 | 27→

      Rien de plus fou! Rien de plus étrange! Mais il y a là-dedans les germes de beaucoup de talent et d’imagination; il y a, sous le rapport de l’art, tel croquis, telle esquisse, qui montrent tout ce que M. Töpffer pourroit faire s’il vouloit y mettre toute explication dont il est capable51.

      Na correspondência trocada entre os dois amigos52, Soret comunica a Töpffer que o poeta alemão permaneceu com os manuscritos durante uns dias, olhando para algumas páginas de uma só vez, descansando depois, porque, dizia ele, «corria o risco de ter uma congestão de ideias»53. Soret acrescenta ainda que Goethe prometera escrever algo sobre os álbuns, o que veio a fazer num texto publicado postumamente no jornal literário Kunst und Alterthum em 183254. O encorajamento de Goethe – entusiasta destes «estranhos pequenos livros»55 e do seu autor pois, entre as pessoas de talento, ele «nunca encontrou um mais original»56 – foi decisivo para que Töpffer completasse dois novos álbuns e se aventurasse na sua publicação. As reflexões de Goethe tornaram estas histórias conhecidas dos literatos e críticos da época57 e fizeram com que o mundo acolhesse a obra daquele que é considerado hoje o pai da banda desenhada.

      Rodolphe Töpffer nasceu em Genebra no ano de 1799, filho de Jeanne-Antoinette Counis e Adam Töpffer, pintor de profissão e caricaturista, de quem Rodolphe herdou o dom da observação e o gosto pela sátira. Como desenhador, Rodolphe Töpffer deve mais ao seu pai do que a algum outro mestre, com quem aprendeu a técnica do desenho a pena e o sentido da caricaturização58. Apesar do seu enorme talento, uma grave doença nos olhos obrigou-o a renunciar, com desgosto, à vocação de pintor, pelo que optou pelo estudo das línguas antigas, o que o conduziu a uma carreira como perceptor e, depois, como professor de Retórica e de Belas-Letras na Academia de Genebra. Dedicou-se ainda à escrita, contando-se entre as conhecidas histórias em estampas, novelas sentimentais, diários de viagens, pequenas farsas dramáticas, ensaios sobre teoria de arte, recensões e textos jornalísticos sobre variados assuntos, desde política a exposições de arte59. ←27 | 28→Em 1822, inicia a sua carreira no internato do pastor Jean Heyer, onde tem a oportunidade de realizar excursões pelos Alpes com os seus alunos, tradição que será acompanhada da narração, através de desenhos, das aventuras vividas nessas viagens60. É nos momentos em que vigia os seus alunos que cria Jabot, Crépin,