– Disseste-me que voltasse dentro de cinco anos.
Stefan semicerrou os olhos.
– Surpreende-me que tivesse tanto autocontrolo.
– O meu pai ter-te-ia matado.
Stefan olhou fixamente para ela e, de repente, ficou paralisado. Aqueles olhos tinham um tom verde peculiar que só recordava ter visto numa ocasião, atrás de uns óculos desfavorecedores.
– Selene? Selene Antaxos?
– Vejo que afinal me reconheces.
– Com dificuldade – Stefan percorreu-a com o olhar. – Meu Deus, já não és nenhuma menina!
Recordava uma rapariga desajeitada, uma adolescente dominada pelo pai demasiado protetor, uma princesa cativa.
«Não te aproximes da minha filha, Ziakas.»
Aquela fora a ameaça velada que o tinha impulsionado a conversar com ela.
Bastava-lhe pensar no nome Antaxos para que o seu dia se estragasse e naquele instante tinha a filha daquele homem diante dele. Os sentimentos que essa noção lhe despertou obrigaram-no a recordar que ela não era responsável pelos pecados do pai.
– Porque estás disfarçada de freira?
– Tinha de enganar os seguranças do meu pai.
– De certeza que não foi fácil. Claro que, se o teu pai não tivesse tantos inimigos, não necessitaria de uma proteção tão férrea – contendo os sentimentos que o inundavam, Stefan levantou-se e contornou a secretária. – O que fazes aqui?
A única lembrança que tinha daquela noite era ter sentido pena dela, um sentimento tão alheio a ele que era por isso mesmo que o recordava. Acreditava que as pessoas tomavam as suas próprias decisões, mas ao vê-la, tão gorducha e desconfortável, pensara que ser a filha de Stavros Antaxos era uma desgraça imerecida.
– Já te explico – disse ela, mas, agachando-se para agarrar a saia do hábito, perguntou: – Importas-te que tire isto? Estou a assar.
– Onde o compraste?
– Fui educada pelas freiras da ilha vizinha, Poulos, que sempre me apoiaram. Elas emprestaram-mo, mas, agora que estou a salvo contigo, já não o necessito.
Considerando que poucas mulheres se sentiam a salvo junto dele, Stefan olhou-a desconcertado, enquanto ela se contorcia até tirar o hábito e ficar totalmente despenteada. Por baixo usava uma blusa branca e uma saia preta justa que abraçava umas pernas espetaculares.
– Quase morria de calor no ferribote. É por isso que não tenho o casaco.
– Que casaco?
– O do fato.
Stefan desviou o olhar das suas pernas, sentindo-se como se lhe tivessem batido na cabeça com um taco de beisebol, e esquadrinhou os olhos de Selene à procura da jovem insegura do passado.
– Estás mudada.
– Espero que sim. De facto, espero parecer a mulher de negócios que sou – Selene vestiu um casaco a combinar com a saia que tirou da mala e apanhou o cabelo com um travessão. – Quando me conheceste, tinha borbulhas e aparelho. Era horrível.
Mas já não tinha nada de feia, pensou Stefan.
– O teu pai sabe que estás aqui?
– O que achas? – disse ela, com um sorriso pícaro que reclamou a atenção de Stefan para os seus lábios voluptuosos.
– Suspeito que o teu pai já deva ter passado várias noites em branco – disse, fazendo um esforço sobre-humano para pensar nela como a menina do passado e não como a mulher em que se transformara. – Deveria oferecer-te alguma coisa. Queres um... Um copo de leite?
Selene afastou uma madeixa de cabelo da cara, entre tímida e sedutora.
– Não tenho seis anos. Costumas oferecer leite às tuas visitas?
– Não, mas não costumo receber menores.
– Não sou menor. Sou uma adulta.
– Isso é evidente – disse Stefan. E, ao desabotoar o colarinho para aliviar o calor que sentia, descobriu que já estava desabotoado. Estaria o ar condicionado avariado? – Vais dizer-me porque estás aqui?
Se o que pretendesse fosse arruinar o seu pai, poderiam chegar a um acordo.
– Vim propor-te um negócio.
Os olhos enormes de Selene transmitiram-lhe tanto desejo, que Stefan sentiu um calor súbito e poderoso, completamente inapropriado, dadas as circunstâncias.
Além das mudanças físicas óbvias, ela era tão inocente como na noite do iate e nem sequer ele era capaz de cair tão baixo.
– Não tenho fama de ajudar as pessoas.
– Eu sei. E não espero um favor. Sei muitas coisas de ti, como que mudas constantemente de mulher porque não queres ter uma relação. Sei que no mundo dos negócios te chamam todo o tipo de coisas, incluindo desalmado e cruel.
– São boas características para fazer negócios.
– E sei que não te importas que te descrevam como um lobo feroz.
– Mesmo assim, vieste.
– Não tenho medo de ti. Passaste sete horas a falar comigo quando ninguém me prestava a mínima atenção – Selene dobrou cuidadosamente o hábito e guardou-o na mala, sem se dar conta de que ao inclinar-se Stefan pôde ver o perfil dos seus seios.
Stefan fracassou na tentativa de desviar o olhar.
– Eras muito doce.
Usou aquela palavra de propósito porque era a mais apropriada para matar a sua libido, mas naquela ocasião não serviu de nada. Porque o olhava ela com aquela expressão de confiar plenamente nele em vez de com precaução?
«Entra, Capuchinho Vermelho, e fecha a porta.»
Selene dedicou-lhe um amplo sorriso.
– A verdade é que me dá uma certa vergonha recordá-lo. Estava tão zangada, que teria feito qualquer coisa para irritar o meu pai, mas tu, apesar de o odiares, não te aproveitaste da situação. Não te riste de mim quando te disse que queria montar o meu próprio negócio, nem quando namorisquei contigo. Com um tato delicioso, disseste-me que voltasse dentro de cinco anos.
Selene falou precipitadamente, com a respiração agitada e Stefan observou-a em silêncio, pensando que lhe escapava algo. O que havia na sua atitude: desespero ou entusiasmo?
– Tens a certeza de que não queres beber nada? – perguntou para ganhar tempo.
– Eu adoraria um copo de champanhe.
– São dez da manhã.
– Eu sei, mas nunca o provei e esta seria a ocasião perfeita. Segundo a internet, vives uma vida cheia de champanhe.
Stefan reparou numa nota de melancolia que o desconcertou. Sempre pensara que os Antaxos tomariam banho em champanhe. Tinham todo o dinheiro do mundo.
– Embora te custe a acreditar, restrinjo as minhas horas de champanhe ao fim do dia – cerrou os dentes e chamou Maria pelo intercomunicador: – Maria, traz-nos um jarro de água ou de limonada bem fresca e qualquer coisa para comer.
– Muito obrigada. Estou morta de fome – disse Selene.
Stefan apoiou-se na secretária, assegurando-se de manter uma distância prudencial.
– Portanto, queres propor-me um negócio. Diz-me o que é e dir-te-ei se posso ajudar-te.
Aquelas palavras pareceram-lhe estranhas. Nunca se oferecia para ajudar ninguém. Tinha aprendido desde muito pequeno a cuidar de si mesmo e a ser autónomo.
–