A conversa acabou com frieza. Anton desligou o telefone e, embora começasse a tocar imediatamente, ignorou-o. Todas as pessoas com algum interesse no mundo das finanças queriam saber o que significava a morte de Leander Kanellis, o filho repudiado por Theo e recém-descoberto pela imprensa, para a sua posição na Kanellis Intracom.
Isso era o que os preocupava e não a sua relação com Theo. Passara dois anos a gerir os seus assuntos, desde que o idoso se retirara para viver numa ilha privada devido à gravidade do seu estado de saúde, que tinham conseguido esconder.
E isso era a única coisa positiva a que podia agarrar-se, porque as ações da Kanellis não suportariam o golpe se todos descobrissem que Theo estava demasiado doente para se preocupar com os seus negócios. Por essa mesma razão, não se incomodara em negar os rumores de que Theo o preparava para gerir o seu império quando o sucedesse.
Praguejando, levantou o telefone e telefonou a Spiro para se assegurar de que não partilharia com ninguém a informação que acabara de lhe dar e ele, parecendo ofendido por ele achar necessário recordar-lhe um princípio tão básico, prometeu-lhe que nunca divulgaria informação confidencial.
Anton desligou, sentou-se na secretária e olhou para o chão. Sentia-se como um malabarista: uma das bolas que tinha de manter no ar era os interesses empresariais de Theo e os dele. A outra, a sua própria integridade e honra. E surgia uma terceira, muito mais imprevisível, que representava Leander Kanellis, um homem que Anton só recordava vagamente, que fugira com dezoito anos de um casamento por conveniência e de quem não tinham voltado a saber nada.
Até àquele momento, quando tinham recebido a notícia de que falecera. Mas nem sequer era isso que estava a causar o caos generalizado, mas a descoberta de que Leander deixara uma família e herdeiros legítimos da Kanellis.
Estendendo o braço, Anton pegou no jornal sensacionalista que dera o exclusivo e observou a fotografia que o jornalista publicara com o artigo. Nela aparecia Leander Kanellis com a sua família num passeio. Ao fundo, via-se um lago e árvores e o sol brilhava. Sobre um desportivo antigo havia uma cesta de piquenique e à frente do carro aparecia Leander, moreno, alto e muito atraente, extremamente parecido com Theo há várias décadas.
Leander sorria para a máquina com uma expressão de felicidade e orgulhoso das duas mulheres loiras que tinha ao seu lado. A mais velha, a sua esposa, era uma mulher bonita, com uma expressão serena que contribuía para explicar a relação duradoura do casal, apesar das dificuldades que tinham enfrentado em comparação com o que teriam vivido se Theo não tivesse…
Anton interrompeu essa linha de pensamento devido à culpa que despertava nele. Desde os oito anos tinha recebido o melhor que a riqueza de Theo podia proporcionar, enquanto aquelas pessoas tinham tido de lutar para…
Voltou a bloquear a sua mente porque ainda não estava com disposição para analisar como a nova situação o afetaria.
Preferia pensar na felicidade de Leander, porque pelo menos isso era uma coisa de que pudera desfrutar e que ele só sentira esporadicamente. Uma felicidade que as três pessoas que apareciam na fotografia irradiavam.
Anton concentrou-se na outra mulher. Embora a fotografia devesse ser antiga, visto que não parecia ter mais de dezasseis anos, Zoe Kanellis já estava prestes a transformar-se numa mulher tão bela como a sua mãe. Tinha a mesma figura esbelta, o seu cabelo dourado, os seus olhos azuis e um sorriso amplo e sensual.
«Felicidade.» A palavra atingiu-o no peito. Outra fotografia acompanhava o artigo, em que se via a versão de vinte e dois anos de Zoe, a sair do hospital com o último membro da família ao colo. A dor e a consternação tinham apagado a felicidade do seu rosto. Estava pálida e magra, e parecia cansada.
Zoe Kanellis, a deixar o hospital com o seu irmão recém-nascido, dizia a legenda da fotografia. A jovem de vinte e dois anos estava na universidade de Manchester quando os seus pais se tinham visto envolvidos num acidente fatal de viação na semana passada. Leander Kanellis morrera imediatamente. A sua esposa, Laura, vivera o suficiente para dar à luz o seu filho. A tragédia acontecera em…
Alguém bateu à porta do escritório e fez com que Anton levantasse a cabeça ao mesmo tempo que entrava a sua secretária, Ruby.
– O que se passa? – perguntou ele, com aspereza.
– Lamento incomodar-te, Anton, mas Theo está na linha principal e quer falar contigo.
Anton praguejou e, por uma fração de segundo, pensou em não atender. Mas isso era impossível.
– Está bem. Passa-me a chamada.
Anton deu a volta à secretária e sentou-se ao mesmo tempo que levantava o telefone e esperava que Ruby lhe passasse a chamada. Infelizmente, a chamada confirmou o seu principal temor.
– Kalispera, Theo – cumprimentou, amavelmente.
– Quero esse menino, Anton – ouviu a voz dura e irascível de Theo Kanellis. – Traz-me o meu neto!
– Não sabia que eras uma Kanellis – disse Susie, olhando com expressão espantada para o famoso logótipo da Kanellis Intracom que encabeçava a carta que Zoe acabara de deixar cair desdenhosamente sobre a mesa da cozinha.
– O meu pai tirou o «Kan» ao apelido quando se instalou aqui – «porque temia que o valentão do seu pai o localizasse e o obrigasse a voltar para a Grécia», pensou Zoe. Mas a Susie deu outra explicação: – Pensou que Ellis seria mais fácil de pronunciar em Inglaterra.
Susie mantinha os olhos esbugalhados.
– Mas sempre soubeste que eras uma Kanellis?
Zoe assentiu.
– Está na minha certidão de nascimento – «e na de Toby», acrescentou para si. – Odeio-o – disse, contendo as lágrimas ao recordar os dois certificados de falecimento em que se via o mesmo nome.
– Esquece-o – Susie apertou-lhe a mão afetuosamente. – Não devia tê-lo mencionado.
E porque não, se estava em todos os jornais graças a um jovem jornalista que reparara no apelido quando cobria a notícia do acidente e se incomodara em investigar? Zoe pensou com amargura que o exclusivo lhe daria uma promoção ou um trabalho melhor num dos grandes jornais.
– É estranho – disse Susie, recostando-se na cadeira enquanto percorria com o olhar a cozinha que servia de salão.
– O quê? – perguntou Zoe, pestanejou para conter as lágrimas.
– Que sejas a neta de um empresário grego multimilionário, mas vivas num apartamento modesto ao lado do meu no centro de Islington.
– Não penses que isto vai ser um conto de fadas na vida real – levantando-se da mesa, Zoe levou as duas chávenas de café para o lava-loiça. – Nem sou nem quero ser a Cinderela. Theo Kanellis – Zoe nunca pensara nele como o seu avô, – não significa nada para mim.
– Mas nesta carta diz que Theo Kanellis quer conhecer-te – indicou Susie.
– A mim não, a Toby.
Zoe virou-se e cruzou os braços. Perdera peso durante as últimas semanas e o seu cabelo, normalmente brilhante e lustroso, pendurava mortiço de um rabo-de-cavalo que enfatizava a tensão das suas feições. Umas sombras profundas rodeavam os seus olhos azuis e os seus lábios, que tinham sempre um sorriso fácil, tinham adotado uma curva descendente que só se alterava quando pegava em Toby ao colo.
– Esse homem repudiou o seu próprio filho! Nunca quis conhecer a minha mãe nem a mim. A única razão por que agora se mostra interessado é porque está envergonhado por a imprensa estar a falar disso. E suponho que é porque tenciona moldar Toby para o transformar num clone de si próprio, já que com o meu pai não o conseguiu – Zoe respirou fundo. – É um homem frio, cruel e déspota e não tenciono deixar Toby nas suas mãos!
– Ena! – exclamou Susie. – Vê-se que