– Portanto, estás acordada – disse ao seu lado.
Zoe abriu os olhos, espantada.
– Pensava que ias dormir durante toda a viagem.
Virando a cabeça, os olhos de Zoe encontraram dois olhos pretos que a observaram com ironia. Anton estava deitado ao seu lado, apoiado sobre um cotovelo e com a cabeça apoiada na mão. Tinha umas calças de seda cinzentas e uma camisa azul pálida.
– Toby… – murmurou ela.
– Está aqui – disse ele, indicando o espaço que havia entre os dois.
Seguindo o seu olhar, Zoe viu o seu irmão, a dormir profundamente.
– Bebeu um biberão inteiro – informou Anton. – Depois, fiz uma tarefa imprópria de um homem da minha classe – brincou.
– Mudaste a fralda? – perguntou Zoe, perplexa.
– Sim, embora tenha sujado o fato. Mas como já mo tinhas molhado com as tuas lágrimas, não me importei de ter de mudar de roupa.
Não acrescentou que se recusara a deixar que o ajudassem. Decidira cuidar do menino a modo de expiação, assim como suportar os olhares de recriminação que recebera do seu pessoal.
– Não sei o que dizer – resmungou Zoe.
– Basta um «muito obrigado».
– Não mereces. Sequestraste-nos.
– Voltamos às hostilidades? – suspirando profundamente, Anton levantou-se.
– Mentiste-me e enganaste-me até conseguires fazer com que perdesse a cabeça.
– Perder a cabeça não serve para o descrever – disse Anton, enquanto abria um armário, – mas pensava que tinha sido por causa do beijo.
Zoe recusou-se a olhar para ele ou a responder à provocação.
– Suponho que não devia estranhar o teu comportamento, visto que cresceste sob a influência de Theo Kanellis – disse, sentando-se e abraçando Toby. – És desconsiderado, cruel e manipulador, para além de careceres de escrúpulos.
– Resumiste a minha personalidade na perfeição, Zoe – disse Anton, desprendendo um casaco de um cabide. – Aceitarias as minhas desculpas por te teres assustado tanto?
– Ordenarias que o avião voltasse para Inglaterra?
Anton fez uma breve pausa no processo de vestir o casaco e limitou-se a dizer:
– Não.
Zoe não conseguiu resistir a olhar para ele e sentiu um nó na garganta ao ver o aspeto magnífico que oferecia, o que a tornou mais consciente de como estava desalinhada.
– Então, as tuas desculpas têm tão pouco valor como a tua palavra – disse, ainda que, assim que falou, sentisse que se acendia uma luz de alarme na sua mente por se ter excedido.
Desviou o olhar, que teve de voltar a elevar para o rosto de Anton quando ele deu a volta à cama até chegar ao pé dela.
Observando-a com o menino ao colo e rodeada pelo edredão, Anton pensou que parecia a representação viva da mãe terra, embora nunca tivesse visto uma estátua com aqueles olhos azuis, o cabelo dourado e os lábios tão carnudos e tentadores.
– Se te tivesse dito a verdade sobre a viagem, terias vindo?
– Não – disse ela, afastando o cabelo da cara.
– Então, a minha honra permanece intacta. Tu não podias continuar onde estavas e o único lugar onde eu podia pôr-te a salvo era em minha casa, na Grécia. Já me desculpei pelos meios que usei, Zoe, mas a verdade é que o menino também tem sangue grego, como tu, e tem o direito de conhecer a sua família grega. Ou será que tencionavas incluir a próxima geração na disputa familiar? Porque se for assim, não és melhor pessoa do que o homem a quem não queres chamar «avô». Pensa nisso – dirigiu-se para a porta e, antes de sair, acrescentou. – Aterraremos dentro de uma hora. A tua mala está na casa de banho, recomendo-te que mudes de roupa antes de sair.
Zoe olhou para as suas costas com ódio e murmurou:
– Caçador de fortunas.
Anton ficou paralisado. Zoe não sabia porque o dissera, mas o seu coração acelerou ao ver que Anton recuava.
A dureza que o seu rosto adquirira cortou-lhe a respiração. Passando ao ataque, acrescentou:
– Foste a minha casa e convenceste-me a seguir-te. Talvez até tenhas encorajado os jornalistas a assustar-me – levantou-se e deixou Toby na cama. – Theo quer o seu neto e estás decidido a cumprir as suas ordens mesmo que signifique levar-me também.
– E isso transforma-me num caçador de fortunas? – perguntou ele, com uma calma enganosa que aterrorizou Zoe.
Cerrando os punhos, tentou não se deixar intimidar.
– Até há três semanas, tu eras o herdeiro de Theo. Não sei muito de leis, mas imagino que o aparecimento de Toby e o meu muda um pouco as coisas. Se não, porque havias de ter tanto trabalho para nos levar para Grécia?
Anton permaneceu calado, olhando para ela fixamente.
– Diz alguma coisa! – explodiu Zoe.
– Estou à espera que chegues às tuas próprias conclusões antes de dar a minha opinião – disse ele.
Zoe cruzou os braços.
– Disseste-me que Theo estava muito doente e que queria o meu irmão. Se me incluíste foi para evitar o escândalo de nos separar. Portanto, suponho que queres agradar ao meu avô – embora uma voz interior lhe aconselhasse que se calasse, não conseguiu conter-se. – Ou traçaste um plano para continuar a ser o herdeiro e tornar-te tutor de Toby?
– Essa é a tua definição de caçador de fortunas? – perguntou Anton, com o olhar fixo nela. Quando assentiu, Anton continuou. – Vê-se que não tiveste em conta que há outro meio mais simples de manter o controlo sobre a fortuna de Theo, em que tu estás envolvida.
– Não sei a que te referes – disse ela, num tom trémulo.
– Bastaria fazer-te minha esposa e adotar Toby. Dois pelo preço de um – disse ele, com um sorriso cruel. – E visto que não tenho honra e minto e sequestro inocentes… – Anton encurralou-a até Zoe chocar contra a parede.
Depois de uma pausa breve e teatral, continuou:
– De facto, Theo adoraria esse plano. Os gregos são muito românticos – olhando para ela fixamente e com um sorriso insinuante, acrescentou: – O que me pergunto é de quem tens mais medo, se do teu avô, de mim… ou de ti própria.
Zoe apercebeu-se de que o seu coração acelerava e de que lhe faltava o ar, mas por mais que tentasse reagir, não conseguiu desviar o seu olhar dos lábios sensuais de Anton.
– Claro que se não estiveres disposta a cumprir o acordo – continuou ele, com um brilho sarcástico que fez com que Zoe sentisse pele de galinha, – posso enviar-te para junto de Theo para te prender até mudares de opinião. Sabes que os homens gregos não têm escrúpulos. Talvez até decida… – levantou a mão e pô-la ao lado da cabeça de Zoe, – beijar-te novamente – murmurou, – ou ir para a cama contigo – e aproximou o seu corpo do dela com uma lentidão provocadora. – De facto, podia fazer-te minha, antes de pisarmos em terra grega e transformar-te…
Zoe esbofeteou-o. Levantou a mão e deixou-a cair com toda a sua força sobre a face dele. A palma doeu-lhe ao entrar em contacto com as suas maçãs do rosto marcadas, mas não se importou.
– Desaparece da minha vista! – exclamou.
Capítulo