Assim como ver o Chalé do Penhasco com sua vista para o oceano havia despertado um antigo sonho de infância de viver à beira-mar, agora também, um antigo desejo de infância voltou, inundando-a: o sonho de administrar sua própria loja.
Até o layout a lembrava da antiga loja de seu pai. Enquanto olhava em volta, imagens dos mais profundos recônditos de sua memória surgiram diante de sua visão através de seus olhos, como uma folha de papel transparente colocada em cima de um desenho. De repente, ela viu as prateleiras cheias de relíquias bonitas — principalmente utensílios de cozinha vitorianos, como era o interesse particular de seu pai — e lá, no balcão, Lacey visualizou a grande caixa registradora de metal, pesada e antiquada, com as teclas rígidas que o pai insistia em usar porque "mantinha sua mente afiada" e "aprimorava suas habilidades em matemática mental". Ela sorriu por dentro, sonhadora, enquanto as palavras de seu pai ecoavam em seus ouvidos e as imagens e memórias apareciam diante de seus olhos.
Lacey estava tão perdida em seus devaneios que não ouviu o som de passos vindo dos fundos da loja, em sua direção. Ela também não notou o homem ao qual os passos pertenciam quando ele emergiu pela porta, com uma carranca no rosto, e marchou até ela. Foi só quando sentiu um tapinha leve no ombro que Lacey percebeu que não estava sozinha.
Seu coração deu um salto. Lacey quase gritou de surpresa quando se virou para encarar o estranho. Era um idoso com cabelos brancos ralos e olheiras arroxeadas sob brilhantes olhos azuis.
"Posso ajudá-la?" o homem perguntou, de uma maneira hostil e áspera.
A mão de Lacey voou para seu peito. Levou um momento para perceber que o fantasma de seu pai não tinha apenas lhe dado um tapinha no ombro e que ela não era realmente uma criança em pé em sua loja de antiguidades, mas uma mulher crescida de férias na Inglaterra. Uma mulher adulta que no momento era uma invasora.
"Ai, meu Deus, mil desculpas!" ela exclamou apressadamente. "Não sabia que havia alguém aqui. A porta estava destrancada".
O homem olhou para ela com ceticismo. "Você não vê que a loja está vazia? Não há nada aqui para comprar".
"Eu sei", Lacey continuou, desesperada para apagar aquela primeira má impressão e a carranca de suspeita do rosto do velho. "Mas eu não pude evitar. Este lugar me lembrou muito a loja de meu pai". Para surpresa de Lacey, ela se viu com os olhos subitamente inundados de lágrimas. "Eu não o vejo desde que era criança".
O comportamento do homem mudou em um instante. Ele passou de carrancudo e defensivo para suave e gentil.
"Querida, querida, querida", disse ele, gentilmente, balançando a cabeça enquanto Lacey rapidamente enxugava as lágrimas. "Está tudo bem, minha querida. Seu pai era dono de uma loja como esta?"
Lacey sentiu-se imediatamente envergonhada por ter despejado suas emoções sobre aquele homem, sem mencionar a culpa de que, em vez de chamar a polícia para expulsá-la de sua propriedade privada, ele reagiu como um psicólogo, com compaixão genuína, encorajamento e interesse. Mas Lacey não conseguiu se conter e abriu o coração.
"Ele vendia antiguidades", explicou, com um sorriso leve nos lábios novamente por causa das lembranças, mesmo enquanto as lágrimas caíam de seus olhos. "O cheiro daqui me deixou nostálgica, e tudo voltou à minha mente. A loja dele tinha o mesmo layout". Ela apontou para a porta dos fundos pela qual o homem provavelmente havia entrado. "Essa sala dos fundos era usada para armazenamento, mas ele sempre quis transformá-la em uma sala de leilão. Era muito longa e se abria para um jardim".
O homem começou a rir. "Venha dar uma olhada. A sala dos fundos aqui também é longa e se abre para um jardim".
Tocada pela compaixão dele, Lacey seguiu o homem pela porta até a sala dos fundos. Era comprida e estreita, lembrando um vagão de trem, e quase idêntica ao cômodo que seu pai queria transformar em uma área para fazer leilões. Passando direto pela sala, Lacey saiu para um jardim maravilhoso. Era estreito e comprido, estendendo-se por cerca de quinze metros. Havia plantas coloridas por todo lado e árvores e arbustos estrategicamente colocados, fornecendo a quantidade certa de sombra. Uma cerca na altura dos joelhos era tudo que a separava do jardim da loja vizinha — que, em contraste com o jardim imaculado em que ela estava, parecia ser usado apenas para armazenamento, com várias barracas grandes e feias de plástico cinza e um fileira de latas de lixo.
Lacey voltou sua atenção para o belo jardim.
"É incrível", elogiou.
"Sim, é um lugar bonito", respondeu o homem, endireitando um vaso caído. "As pessoas que alugaram o local antes o usavam como uma loja de jardinagem".
Lacey notou imediatamente o ar melancólico no tom dele. Ela percebeu então que a grande estufa de vidro à sua frente estava com as portas escancaradas e várias plantas em vasos estavam espalhadas por todo o chão, com as hastes esmagadas e terra derramada. Subitamente, ela ficou curiosa. A visão das plantas espalhadas em um jardim tão bem cuidado parecia estranha. Sua mente se moveu imediatamente de seu pai para o momento presente.
"O que aconteceu aqui?" ela perguntou.
O homem idoso tinha uma expressão abatida. "É por isso que estou aqui. Recebi uma ligação do vizinho esta manhã dizendo que parecia que o lugar havia sido esvaziado da noite para o dia.
Lacey ofegou. "Eles foram assaltados?" Sua mente não conseguia conciliar o conceito de crime com a bela e tranquila cidade costeira de Wilfordshire. Para ela, parecia o tipo de lugar onde o mais próximo que alguém chegaria de cometer uma infração era um garoto travesso local roubar uma torta recém-assada colocada no parapeito de uma janela para esfriar.
O homem sacudiu a cabeça. "Não, não, não. Eles foram embora. Empacotaram todo o estoque e esvaziaram a loja. Nem deram aviso prévio. Também me deixaram todas as suas dívidas. Contas de energia e água para pagar. Uma montanha de faturas". Ele balançou a cabeça, triste.
Lacey ficou chocada ao perceber que a loja havia ficado vazia naquela manhã e que ela inadvertidamente havia se intrometido no desenrolar de uma situação, inserindo-se acidentalmente em uma narrativa misteriosa que havia acabado de começar.
"Sinto muito", disse ela com genuína empatia pelo homem. Agora era sua vez de brincar de terapeuta, de retribuir a gentileza dele. "Você vai ficar bem?"
"Na verdade, não", ele disse, sombrio. "Temos que vender a loja para pagar as contas e, sinceramente, eu e minha mulher estamos velhos demais para esse tipo de estresse". Ele bateu no esterno, como se quisesse indicar a fragilidade do coração. "Mas será uma pena dar adeus a este lugar". Sua voz embargou. "Faz parte da família há anos. Eu amo esta loja. Tivemos alguns inquilinos muito interessantes naquele tempo". Ele riu, os olhos enevoando-se com a lembrança. "Mas não. Não podemos passar por esse transtorno novamente. É muito difícil".
A tristeza no tom dele foi suficiente para partir o coração de Lacey. Em que lugar difícil eles haviam sido colocados. Que situação terrível. A profunda empatia que sentiu pelo homem era agravada por sua própria situação, pela maneira como a vida que ela construíra com David em Nova York fora injustamente arrancada dela. Ela sentiu uma súbita responsabilidade de resolver o problema.
"Vou alugar a loja", ela deixou escapar, as palavras saindo de seus lábios antes que seu cérebro tivesse percebido o que estava dizendo.
As sobrancelhas brancas do homem se ergueram, com evidente surpresa. "Desculpe, o que você acabou de dizer?"
"Eu vou alugar", repetiu Lacey rapidamente, antes que a parte lógica de sua mente tivesse a chance de convencê-la do contrário. "Você não pode vender. Tem muita história, você mesmo disse.