Kim refletia sobre seu primeiro emprego como babá enquanto estava sentada na cozinha, dentro da casa de Bill e Sandra Carver. Era difícil acreditar que mais de dez anos já haviam se passado. Essa década era período de tempo que, de alguma maneira, havia borrado as memórias de trabalhar na capital, escrevendo discursos de esperança com um leve toque de mentiras.
Seu notebook estava a sua frente. Ela havia chegado a marca de quarenta mil palavras em seu livro. Imaginou que estivesse mais ou menos na metade. Talvez, ela terminaria em mais ou menos seis meses. Tudo dependia da direção que as vidas dos três filhos dos Carver tomaria. O mais velho, Zack, estava na nona série naquele ano, encarando o futebol americano como um passatempo, mas levando a sério. O filho do meio, Declan, jogava futebol. E a mais nova, Madeline, praticava ginástica. Kim sabia que teria muito trabalho nos próximos meses.
Ela fechou seu notebook e olhou pela cozinha. Estava descongelando frango para a janta. A bancada já estava vazia, a louça estava limpa, e a quarta leva de roupas estava batendo na máquina de lavar. Até que as crianças chegassem, ela não teria mais o que fazer. E por isso estivera trabalhando em seu livro pelos últimos quarenta e cinco minutos.
Olhou para o relógio e viu que o dia havia passado muito rápido—algo que ela estava começando a entender que acontecia muito com as babás. Ela precisaria sair para pegar as crianças na escola em quinze minutos... e essa não era uma simples tarefa, já que os filhos dos Carver estavam crescendo em escadinha, com a mais nova no primário, o do meio no ginásio e o mais velho no ensino médio. Assim, ela levava pelo menos uma hora no trânsito para pegar todas as crianças e retornar para a casa delas. Mas a tarefa havia ficado mais fácil, agora que Kim recentemente descobrira quão úteis eram os áudio-books para matar tempo no carro.
Ela levantou-se e olhou o frango, quase descongelado na pia. Depois, colocou a roupa na secadora e pegou todos os temperos que precisaria para fazer a janta. Quando estava colocando a páprica na bancada, alguém bateu na porta da frente.
Aquilo era muito comum na casa dos Carver. Sandra Carver era viciada em comprar na Amazon e Bill Carver sempre tinha entregas da FedEx chegando em sua casa. Kim pegou sua bolsa, pensando em já sair para pegar as crianças depois de receber as encomendas.
Ela abriu a porta e olhou instantaneamente para o chão, procurando uma caixa da Amazon. Por isso seu cérebro levou um segundo para entender que havia a forma de uma pessoa à sua frente. Quando olhou para ver o rosto, seu olhar foi bloqueado por—algo.
Fosse o que fosse, a acertou na cabeça. Diretamente entre seus olhos, acima do nariz. O barulho do golpe entrou em sua cabeça, mas ela mal teve tempo para entender antes de sentir que estava caindo.
Quando caiu no chão de madeira dos Carver, a parte de trás de sua cabeça bateu com força no piso. Ela sentiu sangue saindo do nariz ao tentar rolar para trás.
A pessoa na entrada deu um passo à frente e fechou a porta. Kim tentou gritar, mas havia muito sangue em seu nariz, descendo pela garganta e pela boca. Ela tossiu, quase engasgada, e a pessoa deu mais um largo passo à frente.
Ela pegou o mesmo objeto novamente—um tubo. Kim refletiu vagamente enquanto a dor invadiu sua mente como um furação—e aquela foi a última cena que ela viu.
Antes do golpe final, sua mente chegou a um lugar estranho. Kim Wielding morreu pensando no que aconteceria com aquele frango, ainda descongelando na pia dos Carver.
CAPÍTULO UM
Por conta da maneira como sua vida começara—uma mãe morta, um pai preso e avós que sempre estiveram em volta dela—Chloe Fine geralmente preferia fazer as coisas por conta própria. As pessoas às vezes referiam-se a ela como alguém muito introvertida e, por ela, estava tudo bem. Era aquela personalidade que havia a levado a ter notas espetaculares na escola e a ajudado a ir muito bem nos estudos e treinamentos da academia do FBI.
Mas era também aquela personalidade que a fizera mudar-se para seu novo apartamento sem uma única pessoa para ajudá-la. Claro, ela poderia ter contratado uma empresa de frete, mas seus avós haviam a ensinado o valor do dinheiro. E já que tinha braços fortes, costas fortes e uma mente teimosa, ela havia escolhido se mudar por conta própria. Afinal de contas, tinha apenas dois móveis pesados. Todo o resto seria muito fácil de carregar.
Mas Chloe percebeu que esse não era o caso quando finalmente conseguiu arrastar sua cômoda escada acima—com a ajuda de um carrinho, várias catracas e degraus felizmente bem largos e que levavam a seu apartamento, no segundo andar. Sim, ela havia conseguido, mas tinha certeza de que havia machucado um ou dois pontos das costas no caminho.
Ela havia deixado a cômoda por último, sabendo que aquela seria a parte mais difícil da mudança. Intencionalmente, havia guardado as coisas em caixas leves, sabendo que faria o trabalho sozinha. Pensou que poderia ter ligado para Danielle pedindo ajuda, mas nunca fora do tipo que pedia favores familiares.
Chloe afastou algumas caixas de livros e cadernos e se jogou na poltrona que tinha desde o segundo ano da faculdade. Pensar em Danielle estando ali com ela para começar a organizar todas as coisas era algo atraente. As coisas não estavam tão tensas entre elas desde que Chloe havia descoberto a verdade sobre o que acontecera com os pais delas quando elas eram crianças, mas com certeza havia algo diferente. As duas sabiam muito bem do peso de seu pai em suas mentes—da verdade do que ele havia feito e dos segredos que estiveram guardados por muito tempo. Chloe sentia que as duas estavam lidando com aqueles segredos de suas próprias maneiras, e que elas sabiam que suas opiniões divergiam de um jeito quase psíquico, algo que acontecia apenas com irmãos muito próximos.
O que ela nunca ousara expressar a Danielle era o quanto ela sentira falta de seu pai. Danielle guardara muito rancor dele após sua prisão. Mas Chloe sentira a falta da figura de um pai em sua vida. Era ela quem sempre pensara que, talvez, os policiais estavam errados, e que era impossível que seu pai tivesse matado sua mãe.
E fora aquela esperança e crença que resultara na pequena aventura que elas haviam enfrentado juntas, culminando na prisão de Ruthanne Carwile e em um ponto de vista totalmente novo no caso Aiden Fine. O problema de aquilo tudo ser descoberto para Chloe, no entanto, é que ela havia começado a sentir a falta dele ainda mais. E ela sabia que Danielle poderia encarar aquilo como algo terrível, até mesmo masoquista.
Mesmo assim, apesar de tudo, ela queria ligar para Danielle para celebrar sua pequena vitória de se mudar para uma casa nova. Era um apartamento pequeno, de dois quartos, no bairro Mount Pleasant em Washington. Era pequeno e ela teria dificuldades de pagar, mas era exatamente o que estava procurando. Fazia quase dois meses desde a última vez em que elas haviam saído juntas—o que parecia estranho, dado tudo o que acontecera na última vez em que haviam compartilhado seu tempo. Elas haviam conversando por telefone algumas vezes e, mesmo sendo boas conversas, todas elas foram rasas. E Chloe não gostava de coisas rasas.
Foda-se, ela pensou, pegando seu telefone. O que poderia dar errado?
Ao procurar o número de Danielle, ela deu-se conta da realidade da situação. Claro, fazia apenas dois meses desde que tudo acontecera, mas elas eram pessoas diferentes agora. Danielle havia começado a ajeitar sua vida. Ela tinha um trabalho com chances de crescer muito—bartender e gerente assistente em um bar que estava crescendo muito em Reston, Virginia. Já Chloe ainda estava tentando descobrir como se transformar: de alguém que estivera recentemente noiva para alguém solteira, que aparentemente nem se lembrava como se fazia para conseguir alguém para um encontro.
Você não pode forçar algo assim, ela pensou. Especialmente com Danielle.
Com seu coração agitado, Chloe