Quando Nate decidiu, ou melhor dizendo, foi forçado a abandonar sua casa em Ipswich, sua melhor e única opção foi o local em Londres onde as primas Theo e Ellie lutavam contra problemas em uma das mãos e o próprio sustento na outra.
Ele deu um suspiro e reorganizou as garrafas de vidro nas prateleiras, tornando a exibição mais uniforme. Líquidos de cores diferentes brilhavam com uma promessa perolada, enquanto outros pareciam a lama raspada dos sapatos ao final do dia.
Na primeira vez em que a loja dele foi invadida, durante a noite, Theo passou por ali para instalar um complexo mecanismo de trava na porta que, com certeza, manteria os ladrões fora.
No segundo episódio, a loja foi arrombada no meio do dia, e Ellie veio e depositou uma derringer não mão dele com um aviso para praticar pontaria.
Seu punho apertou o gargalo de uma das garrafas de vidro que brilhava com uma substância mais azul do que o oceano. Ele fizera cada uma dessas poções com as próprias mãos, só queria ganhar a vida praticando a alquimia que ele estudou por anos para dominar. Esse foi seu plano anterior, até que os Darlingtons se envolveram nos negócios dele. Ele engoliu em seco quando uma onda familiar de torpeza o atingiu, tão amarga quanto o absinto.
Como se ele fosse conseguir encontrar o próprio caminho nesta floresta de tolos.
Até agora, ele apenas trouxera decepção para a família.
Ele terminou de arrumar as garrafas de vidro e voltou para ficar atrás do balcão. Ele o havia montado no final da loja, com uma caixa registradora, às vezes utilizada, e muitas prateleiras embutidas na estrutura, o que deixava espaço para separar seu volumoso estoque de ervas. A maioria de suas poções não seria possível sem um boticário bem abastecido de tônicos, ervas e digestivos. Ele usava esses princípios básicos para realizar sua alquimia: um chá de lavanda pode ser transmutado em um frasco de luar, enquanto a camomila e casca de limão podem se transformar em sol engarrafado. As possibilidades eram infinitas.
Nate ergueu um dos sacos de lavanda, inalando como se a suave fragrância pudesse ajudá-lo a acalmar os nervos. Cada dia que ele abria a loja para o mundo se transformava em mais um triunfo e outro risco, fosse dos clientes irritados ou dos ladrões que corriam desenfreados por esta parte da cidade. Apertou mais a bolsa. Sentia saudades terríveis de casa.
Cantarolou uma melodia para si e tirou um saco de hortelã e um de poejo, colocando-os na bancada perto da balança. Enquanto esperava que a gentalha normal passasse por aquelas portas implorando para negociar ou oferecer menos moedas do que o razoável, ele pelo menos continuaria criando mais produtos. Ele aprendeu toda a alquimia com o tio, uma alma roubada muito cedo deste mundo. Tuberculose era uma doença cruel.
Ele balançou um pouco de hortelã-pimenta na balança, as pequenas folhas secas acumulando-se no centro.
A porta se abriu com força suficiente para o vidro fazer barulho.
Nate parou no meio do giro e deslizou a mão livre sob o balcão para a derringer que Ellie trouxera.
Não outro roubo. Uma terceira vez, e ele ficaria tentado a se jogar no Tâmisa.
Uma mulher entrou de maneira repentina, os ombros arfando e a respiração saindo como sinais de pontuação.
Ela bateu a porta, mas ele não teve um vislumbre dela até que ela girou para encará-lo. Estava vestida como uma operária, com calças marrons, uma camisa azul enrolada até os cotovelos e um lenço vermelho em volta do pescoço. Os cabelos castanho-escuros estavam presos em um rabo de cavalo, e o olhar penetrante vindo daqueles olhos fundos o manteve imóvel. Com lábios carnudos e traços delgados, ela possuía uma beleza impressionante.
Pânico brilhava nos olhos dela.
— Ajude-me. — ela cruzou o espaço entre eles. — Preciso de um lugar para me esconder.
Nate engoliu em seco.
Qualquer pessoa em fuga traria mais problemas consigo do que ele gostaria de lidar por uma vida. No entanto, assim que ela chegou ao balcão, a súplica naqueles olhos castanhos o balançou.
— Aqui. — ele disse, gesticulando para trás do balcão.
A prateleira de baixo era grande o suficiente para caber a cesta de lixo que ele havia colocado ali. Ele puxou a cesta e a colocou ao lado dele, onde trabalhava com a balança:
— Pode tentar se espremer.
Ela assentiu, o rabo de cavalo balançando com o movimento. A mulher se agachou e começou a se enfiar no espaço confinado, dobrando-se com surpreendente facilidade.
— Obrigada. — ela disse assim que se acomodou no espaço, embora a voz tenha saído abafada.
Nate passou os dedos pelos cabelos e soltou um suspiro. Ele saiu de casa para evitar problemas, mas desde o momento em que chegou em Islington, encontrava-os mais e mais. Como as primas sobreviveram por aqui o deixava perplexo. A balança oscilou quando ele pegou o saco de hortelã e voltou a se dedicar à tarefa, mesmo com o coração disparado a mil léguas por segundo.
Em que tipo de problema essa mulher se encontrava?
As figuras ameaçadoras, aglomerando-se em frente à sua porta, responderam à pergunta. Com base nas carrancas dos sujeitos, suas calças em mau estado e as armas pesando nos cintos, os aparatos de uma gangue.
Mais uma vez, sua pobre porta de vidro foi aberta, batendo contra a parede com uma reverberação que o fez estremecer. O maior dos três homens galopou na direção dele, os passos pesados audíveis pelo cômodo, fazendo as garrafas de vidro nas prateleiras chacoalharem. Nate teria que reorganizá-las.
O homem parou em frente ao balcão, os olhos escuros brilhando com ameaça intencional.
— Onde está a garota?
Capítulo Dois
Belle Griffiths não planejava fugir para salvar a própria vida hoje; mas descobriu, ao longo dos anos, que esse tipo de peripécia não costumava vir acompanhada de batidas educadas à porta ou leves cutucadas de dedo.
Trabalhar durante anos como a principal incendiária de Jack Blair significava colecionar inimigos como suas roupas colecionam buracos.
Tentar deixar a equipe dele?
Eu posso muito bem ter assinado minha sentença de morte.
Belle puxou os joelhos mais contra o peito, as paredes das prateleiras fechando-se em torno dela. Se fosse claustrofóbica, poderia ser um problema, contudo, os medos dela sempre envolveram alturas. O homem que ela assustou atrás do balcão trocava o peso entre os pés, fazendo uma tentativa de normalidade, apesar da interrupção dela. Ele estava perto o suficiente para ela ter um vislumbre dele, e do cheiro de bergamota e ervas.
O homem, esguio, usava um colete grosso cinza e uma camisa branca clara, os suspensórios combinando acentuados por um cinto preto. Os traços dele eram suaves, do queixo ao nariz, e os cabelos escuros e espessos estavam penteados para o lado. Tudo na aparência gritava limpeza.
Belle engoliu em seco e enterrou o queixo ainda mais nos joelhos. Culpa trovejou por ela, mas com o pânico agarrando-a pela garganta, ela não ousou se mexer. A porta se abriu, e ela ouviu o tom familiar de Leonard.
O dono da loja deslizou uma garrafa de vidro para ela e a girou.
Belle estendeu a mão e aceitou a garrafa.
Ele não provou, então talvez ele quisesse que ela derramasse o líquido. Era veneno? Algum tipo de gás para matá-la no local? Ela aproximou a garrafa de vidro para olhar o líquido ali, que parecia tinta.
— Que garota procura? — o sotaque polido e educado do homem deixou claro que ele não era daqui. — Algumas já passaram na loja hoje.
Belle agarrou a garrafa de vidro com um pouco mais de força. Ela esperava que ele começasse