— A economia está ruim — disse ele, encolhendo os ombros como se nada disso realmente importasse. — Quem pode assegurar que você vai encontrar algo rapidamente?
Eu não podia acreditar nisso. Não. Podia. Acreditar. Nisso. Na semana passada, tínhamos acabado de vender todos os meus móveis na OLX porque os dele já “cabiam” no lugar. Eu cancelei meu aluguel, paguei a multa pela quebra de contrato e ficaria sem-teto no final do mês… o que convenientemente aconteceria em dois dias.
— Aqui. — Ele me entregou um cartão.
Um cartão. Eu olhei para o envelope lavanda lacrado. Eu deveria abri-lo? A empresa de cartões realmente tinha um cartão do tipo Estou-te-dando-um-pé-na-bunda-mas-boa-sorte-com-tudo?
— O que é isso?
— Aí tem o primeiro mês do aluguel e metade da fiança que você pagou. Achei que era justo devolvê-lo.
Achou justo? Eu olhei para o cartão novamente, me perguntando o que ele havia escrito nele, tentada a abri-lo naquele momento. Em retrospecto, ele ter me cobrado uma fiança pelo aluguel deveria ter sido o primeiro sinal.
Certo, talvez não o primeiro.
— Então, onde exatamente você acha que vou morar?
Desprezo. Eu passei da raiva para o desprezo. Agora eu era oficialmente uma mulher desprezada.
Não é de admirar que os homens não devessem nos contrariar. Nem o inferno tinha tanta fúria como eu naquele momento, ele não chegava nem perto. Eu poderia ter estripado ele com a faca de peixe chique que descansava contra meu prato.
— Bem, eu não quero parecer sem coração — continuou Jason, estudando seu prato antes de olhar para cima com a expressão menos empática que eu já vi. — Mas agora isso não é realmente problema meu, não é?
A mulher na mesa ao lado engasgou e foi quando eu percebi que a maioria das pessoas haviam ficado em silêncio para acompanhar o melodrama que estava acontecendo na minha vida.
— Não, suponho que não. Eu acho que quando você termina com sua namorada porque ela perdeu o emprego, você pensa que nada é problema seu. — Empurrei minha cadeira, me envolvi em minha jaqueta Ann Taylor e peguei minha bolsa. — Ah, espera! Sabe qual é o seu problema?
Ele balançou a cabeça, um pequeno sorriso puxando sua boca em pontas cruéis de cada lado.
— Conseguir tirar a mancha de Bordeaux de sua Caxemira. — Peguei nossa garrafa de vinho pela metade e despejei na cabeça dele. — Boa sorte com isso.
Eu saí furiosa, um punhado de aplausos seguindo em meu rastro. Lágrimas de raiva quase me cegaram quando cheguei ao saguão.
— Por favor, permita-me. — O recepcionista empurrou a porta e segurou-a para mim, enquanto eu marchava para a noite fria de primavera. — Boa sorte, senhorita.
Sim. Eu precisaria de muita sorte.
2
DOIS
EM FRENTE AO RESTAURANTE, encostado na calçada ao lado, estava o BMW M5 de Jason. Apenas parado lá, totalmente inocente. Claro, o carro não me ofereceria uma carona para casa e Jason tinha escolhido um restaurante longe de uma estação de ônibus ou metrô.
Mas, lá estava ele. Bem ali. Jason era do tipo que não achava necessário ter que pagar pelo estacionamento com manobrista e achar aquela vaga tinha sido uma sorte idiota.
Esperei um momento para ver se ele sairia do restaurante para me checar. Se talvez… apenas talvez, ele fosse humano o suficiente para querer se certificar de que eu estava bem e me oferecer uma carona para casa.
Quando dois minutos se passaram comigo me adaptando à leve brisa fria do ar noturno, percebi que de jeito nenhum ele desperdiçaria um bife perfeitamente bem preparado. Ele provavelmente tirou o suéter, jogou-o em uma garçonete para colocá-lo na água e voltou a comer.
Eu olhei para o BMW.
Eu olhei para o manobrista.
Eu olhei para o BMW novamente.
Para ser justa, o carro não tinha feito nada contra mim. Mas, como uma extensão de Jason, essa noite desastrosa e tudo o que estava errado na minha vida agora, aquele era um alvo muito bom. Escorregando ao lado do pneu dianteiro, tirei a tampa da válvula de ar. Com minha chave, eu leeeeeeentamente deixei o ar sair do pneu com um suave shuuuu até que o aro descansou no chão.
Em seguida, passei para o próximo pneu… e o próximo.
Considerei deixar um pneu cheio só porque parecia fora do lugar. Mas, pensando bem, aquele pequeno assobio de ar era extremamente catártico. Então, eu esvaziei aquele também.
Sentando em um banco na calçada, chamei um táxi, esperando não ter motivo para me estressar com mais essa despesa mais tarde. Ignorei o ar frio da noite de fim de verão e esperei.
Jason levou mais sete minutos para finalmente aparecer. Eu me perguntei se ele tinha comido a sobremesa. Provavelmente. Provavelmente se certificou de pedir aquele pudim que eu amava, só por maldade.
Ele fingiu não me notar e definitivamente não notou todos os pneus vazios. Até ele abrir a porta. Então ele percebeu que o carro parecia um pouco mais baixo do que o normal. Então ele olhou para os pneus. Então para mim.
A expressão em seu rosto… foi uma coisa linda.
Ele não se aproximou de mim ou contornou o BMW. Ele apenas gritou comigo por cima do capô.
— Você cortou meus pneus?
— Não. Eu nunca cortaria os pneus de ninguém. Nem mesmo os seus — Então, só porque eu admitia para mim mesma que aquilo tudo tinha ficado um pouco ridículo… não importa o quão catártico fosse, eu adicionei: — Cresça.
O sujo falando do mal lavado. Bons tempos.
— Então eles magicamente esvaziaram? — Venenoso. Como eu nunca percebi esse traço venenoso nele?
Três anos sem perceber? Aquilo parecia demais, mesmo para alguém tão focada nos estudos e carreira quanto eu. Comecei a questionar todas as conversas em que ele dizia ser o mais esperto, mais esperto do que todos ao seu redor, e percebi que esperto provavelmente não era a palavra certa. Eu realmente estava cega. É melhor eu me tornar um pouco mais atenta se quiser sobreviver no mundo como uma adulta.
E talvez devesse parar de insistir que a gelatina era um grupo alimentar. Mas, alguns padrões permanecem conosco mesmo depois de crescer.
— Eu não sei sobre mágica. Quer dizer, o que é mágica, afinal? Acho que teria sido mágico se meu táxi tivesse chegado aqui antes de você decidir ver se eu fui pega pedindo carona. Mas, infelizmente, ainda estou esperando. — Eu sorri para ele. Um daqueles sorrisos largos e brilhantes que na verdade dizem: Ha Ha Na Sua Cara em vez de Ei, Você é Bem Fofo. Chega de sorrisos fofinhos para ele. — Então, eu suspeito que o mundo da magia está morto.
Peguei um jornal que alguém havia deixado no banco e fingi ler. Deve ter parecido algo bobo a se fazer ali sob a luz fraca do poste, mas parecia um adereço lógico para esta farsa na qual eu estava finalmente assumindo um papel ativo.
— Você acha que pode simplesmente rasgar meus pneus e eu não vou chamar a polícia? — Ele já estava discando. — Alô? 190? Sim, quero denunciar uma agressão. Não, eu não estou ferido. Não fui eu quem foi agredido.
Neste ponto, eu estava tendo dificuldade em acreditar que ele ligou para o 190, que ele estava chamando aquilo de uma agressão. Sem mencionar que eu realmente tinha namorado esse idiota por trinta e três meses. Isso era mais de um mês para cada ano da minha vida.
Talvez