A cripta era a única estrutura que Gareth sabia que seria deixada intacta. Afinal, quem iria se preocupar em atacar um túmulo? Aquele era o único lugar que lhe restava, ele sabia que ninguém jamais se preocuparia em procurar por ele ali, aquele era o lugar onde ele poderia procurar abrigo. Era um lugar onde ele poderia se esconder e permanecer completamente sozinho. Era um lugar onde ele poderia estar com seus antepassados. Por mais que Gareth odiasse seu pai, curiosamente, ele se encontrou desejando estar mais perto dele ultimamente.
Gareth cruzou apressadamente o campo aberto, uma rajada de vento frio lhe fez estremecer e ele enrolou o manto esfarrapado apertadamente ao redor de seus ombros. Ele ouviu o grito estridente de um pássaro de inverno e quando ele olhou para cima viu uma enorme e terrível criatura preta voando em círculos no alto, certamente com cada grito, ela antecipava a queda dele, sua próxima refeição. Gareth não podia culpá-la. Ele sentia que já estava nas últimas e tinha certeza que ele parecia ser uma bela refeição para o pássaro.
Gareth finalmente chegou ao edifício, ele agarrou a maçaneta da porta de ferro maciço com as duas mãos e puxou-a com toda a força, o mundo girava, Gareth estava quase delirante de exaustão. A porta rangeu e ele precisou usar toda a sua força para erguê-la.
Gareth se meteu rapidamente na tumba escura, a porta de ferro bateu com força e ecoou atrás dele.
Ele retirou a tocha apagada do suporte que estava na parede, golpeou sua pederneira e acendeu-a, ela brindava apenas a luz suficiente para iluminar os degraus enquanto Gareth mergulhava cada vez mais fundo na escuridão. À medida que ele descia os degraus, o lugar se tornava cada vez mais frio e as correntes de ar se intensificavam, o vento assobiava ao penetrar pelas pequenas rachaduras. Ele não podia evitar sentir que eram seus antepassados quem estavam uivando para ele, repreendendo-o.
“DEIXEM-ME EM PAZ!” Ele gritou em resposta.
Sua voz ecoou novamente pelas paredes da cripta.
“VOCÊ VAI TER O SEU PRÊMIO EM BREVE!”
Ainda assim o vento persistia.
Gareth, enfurecido, desceu mais fundo, até que finalmente chegou à grande câmara de mármore, escavada com o seu teto de três metros de altura. Todos os seus antepassados jaziam ali, sepultados em sarcófagos de mármore. Gareth marchou solenemente pelo corredor, seus passos ecoavam no mármore, em direção ao final da cripta, onde seu pai jazia.
O velho Gareth teria esmagado o sarcófago de seu pai. Mas agora, por alguma razão, ele estava começando a sentir apreço por ele. Ele mal conseguia entender. Talvez fosse porque o efeito do ópio estava passando; ou talvez fosse porque Gareth sabia que em breve, ele mesmo também estaria morto.
Gareth chegou ao alto sarcófago, debruçou-se sobre ele e inclinou sua cabeça para baixo. Ele surpreendeu a si mesmo quando começou a chorar.
“Eu sinto sua falta, pai.” Gareth gemia, sua voz ecoou no vazio.
Ele chorava sem cessar, as lágrimas escorriam pelo seu rosto, até que finalmente seus joelhos ficaram fracos, ele cedeu à exaustão e caiu ao lado do mármore, ele ficou ali, sentado no chão, encostado na tumba. O vento uivava como resposta e Gareth baixou a tocha, cuja chama se extinguia cada vez mais na escuridão. Gareth sabia que logo tudo seria escuridão e que, em breve, ele iria se juntar a todos aqueles que ele mais amava.
CAPÍTULO CINCO
Steffen caminhava taciturno pela estrada solitária da floresta, enquanto regressava lentamente da Torre de Refúgio. Seu coração estava destroçado ao deixar Gwendolyn, a mulher a quem ele havia jurado proteger, lá sozinha. Sem ela, ele não era nada. Desde que Stephen a conhecera, ele sentia que tinha finalmente encontrado um propósito na vida: proteger Gwendolyn, dedicar sua vida a recompensá-la por permitir que ele, um mero servo, pudesse ascender, e acima de tudo, recompensá-la por ser a primeira pessoa na sua vida a não detestá-lo nem a subestimá-lo com base em sua aparência.
Steffen tinha se sentido orgulhoso por ajudá-la a alcançar a Torre em segurança. Mas deixá-la ali fez com que ele ficasse sentindo-se vazio por dentro. Para onde ele iria agora? O que ele faria?
Sem Gwen para proteger, sua vida se encontrava sem rumo mais uma vez. Ele não podia voltar à Corte do Rei ou a Silésia: Andronicus tinha derrotado a ambas e ele recordava a destruição que tinha visto quando fugiu de Silésia. Era a última coisa de que ele se lembrava: todo o seu povo era cativo ou escravo. Não fazia sentido voltar. Além disso, Steffen não queria atravessar o Anel novamente e ficar tão longe de Gwendolyn.
Steffen caminhou sem rumo por horas, percorrendo as trilhas sinuosas da floresta, meditando até que lhe ocorresse um lugar para onde ir. Ele seguiu a estrada do Norte e subiu até o topo de uma colina, desde aquele ponto de observação, ele avistou à distância uma pequena aldeia, no topo de outra colina. Ele dirigiu-se para lá e quando ele chegou, ele virou-se para trás e viu que aquela aldeia tinha o que ele precisava: uma visão perfeita da Torre de Refúgio. Se Gwendolyn alguma vez quisesse sair dela, ele queria estar por perto para assegurar-se de que ele estaria lá para acompanhá-la e protegê-la. Afinal, sua lealdade era para com ela agora. Ele não devia sua lealdade a um exército ou a uma cidade, mas sim a Gwendolyn. Ela era sua nação.
Ao chegar à pequena e humilde aldeia, Steffen decidiu que ficaria ali, naquele lugar, onde ele poderia sempre ver a Torre e estar pendente de Gwendolyn. Ao passar através de seus portões, ele viu que era uma cidadezinha pobre e sem graça, outra pequena aldeia nos arredores mais distantes do Anel. Ela estava tão escondida na floresta do Sul que os homens de Andronicus, certamente, nem sequer se incomodariam em chegar até ali.
Steffen chegou sob os olhares de surpresa de dezenas de moradores, seus rostos estavam marcados pela ignorância e falta de compaixão, todos olhavam para ele boquiabertos revelando o desprezo e escárnio tão familiares que ele tinha recebido desde que tinha nascido. Ele podia sentir os olhos zombeteiros de todos sobre ele, enquanto todos eles examinavam sua aparência.
Steffen queria dar a volta e correr, mas ele se obrigou a não fazer isso. Ele precisava estar perto da Torre e por amor a Gwendolyn, ele suportaria qualquer coisa.
Um morador, um homem corpulento em seus quarenta anos e vestido com roupas esfarrapadas, tal como os outros, se virou e dirigiu-se a Stephen ameaçadoramente.
“O que nós temos aqui, uma espécie de homem deformado?”
Os outros riram, deram a volta e se aproximaram.
Steffen manteve a calma, ele já contava com aquele tipo de saudação, a qual ele tinha recebido durante toda sua vida. Ele havia descoberto que quanto mais provincianas eram as pessoas, mais alegria elas sentiam em ridicularizá-lo.
Steffen recostou-se e assegurou-se de que seu arco estivesse pronto, caso aqueles aldeões fossem além de cruéis, violentos. Ele sabia que se fosse preciso, ele poderia abater vários deles em um piscar de olhos. Mas ele não estava ali em prol da violência. Ele estava ali para encontrar abrigo.
“Ele pode ser mais do que apenas uma simples aberração, não é?” Perguntou outro homem, enquanto um grupo grande e crescente de aldeões ameaçadores começou a rodeá-lo.
“Pelas suas divisas, eu diria que ele é.” Disse outro. “Isso parece uma armadura real.”
“E o arco – é de couro fino.”
“Sem mencionar as flechas. A ponta delas é de ouro, não é?”
Eles pararam a escassos metros de distância e olhavam para ele carrancudos e de forma ameaçadora. Eles lhe fizeram lembrar os valentões que o atormentavam quando ele era criança.
“Então, quem você é, seu bicho estranho?” Um deles perguntou zombeteiramente.
Steffen respirou fundo, determinado a manter a calma.
“Eu não quero fazer dano a ninguém.” Ele começou a dizer.
O grupo