Por isso, pouco depois de Luis se afastar, e apesar de não parar de se repetir que devia olhar para a cara dele, Suki percebeu que não conseguia levantar o olhar. Para tentar disfarçar o tremor dos seus dedos, apertou as mãos contra o copo de vinho branco com sumo e ficou com falta de ar ao ver que Ramón se sentava ao seu lado em vez de ocupar o lugar de Luis, como pensara que faria.
Os segundos passaram lenta e dolorosamente enquanto os olhos de Ramón, fixos nela, estudavam o seu perfil.
– Feliz aniversário, Suki – replicou, em espanhol.
A sua voz tinha um matiz misterioso, sombrio, perigoso… Ou talvez fosse apenas por causa da sua imaginação febril. Tremeu por dentro e pôs uma madeixa atrás da orelha, antes de voltar a apertar o copo com força.
– Obrigada – murmurou, ainda com a cabeça encurvada.
– O normal é olhar para uma pessoa nos olhos quando fala contigo – repreendeu-a Ramón. – Ou a tua bebida é mais interessante do que eu?
– É. Quer dizer… Quero dizer que é o normal, não que a minha bebida é…
– Suki, olha para mim – interrompeu ele, num tom imperioso.
Não teria podido negar-se, mesmo que quisesse. Quando virou a cabeça, encontrou os seus olhos verdes intensos fixos nela.
Mal conhecia Ramón, só o vira algumas vezes. A primeira fora há três anos, quando Luis lho apresentara na cerimónia de licenciatura na universidade e, cada vez que voltava a encontrar-se com ele, era mais difícil falar. Era absurdo. Além disso, não se tratava só de que Ramón estivesse completamente fora do seu alcance, mas também estava noivo. A sortuda era Svetlana Roskova, uma modelo russa muito bonita.
No entanto, quando levantou o olhar, já não conseguiu desviar os olhos dele, nem pensar noutra coisa senão em como era incrivelmente irresistível: A pele azeitonada, o pescoço robusto, cuja base conseguia ver através dos dois botões desabotoados da sua camisa azul-marinho, os dedos compridos…
– Está melhor assim – murmurou, com satisfação. – Alegra-me não ter de passar o resto da noite a falar com o teu perfil, embora não seja verdade que possa saber-se se estão a ser sinceros se nos olharem nos olhos enquanto falam.
Suki detetou um matiz evidente de ressentimento na sua voz, envolto numa raiva mal disfarçada.
– Aconteceu alguma coisa? – aventurou. – Pareces incomodado.
Riu-se, brincalhão.
– Achas? – perguntou.
O seu tom transformou a perplexidade de Suki em irritação.
– Diverte-te que me preocupe contigo?
Os olhos verdes de Ramón estudaram o seu rosto, parando nos seus lábios.
– O meu irmão e tu estão juntos? – perguntou, sem responder à pergunta.
– Juntos? – repetiu ela, como um papagaio. – Não sei a que te…
– Queres que seja mais explícito? Foste para a cama com o meu irmão? – exigiu saber.
Suki soprou, espantada.
– Desculpa?
– Não tens de te fingir de ofendida com a minha pergunta. Basta responder.
– Olha, não sei o que se passa, mas é evidente que, esta manhã, te levantaste da cama com o pé esquerdo, portanto…
Ramón praguejou em espanhol.
– Faz o favor de não me falar de camas.
Suki franziu o sobrolho.
– Vês? Estás a dar-me razão. O que me leva a perguntar-te porque vieste ao aniversário do teu irmão se estás de tão mau humor.
Ramón cerrou os dentes.
– Porque sou leal – replicou. – Porque, quando dou a minha palavra, cumpro-a.
A fúria gélida com que pronunciou aquelas palavras deixou-a com falta de ar.
– Não estava a questionar a tua lealdade nem…
– Ainda não respondeste à minha pergunta.
Suki, que não entendia a reviravolta que a conversa dera, abanou a cabeça.
– Provavelmente, porque não te diz respeito.
– Achas que não me diz respeito? – perguntou, olhando para ela, carrancudo. – Quando o Luis te trata como se fosses dele e me devoras com os olhos?
Suki observou-o, entre espantada e indignada.
– Eu não…!
Ramón deixou escapar uma gargalhada cruel.
– Quando cheguei, fingias que não te atrevias a olhar para mim, mas, desde que te viraste, não me tiraste os olhos de cima. Vou fazer-te um aviso: Por mais que ame o meu irmão, partilhar uma mulher com outro não é para mim, portanto, bem podes esquecer a ideia de fazer um ménage à trois.
– És… Meu Deus, és desprezível! – exclamou ela.
Não sabia o que a horrorizava mais: Se o facto de perceber que se sentia atraída por ele ou de não ter o menor reparo de lho dizer na cara.
– Não terás tido uma deceção porque estraguei essa fantasia que criaste na tua mente?
– Garanto-te que não sei do que falas. E lamento se alguém te extraviou um punhado de milhões, deu um pontapé ao teu cão ou seja o que for que te deixou que tão mau humor, mas estás a um passo de levar com a minha bebida na cara, portanto, sugiro que feches a boca agora. Além disso, como te atreves a falar de trios? Não estás noivo?
Nesse momento Luis apareceu com a garrafa de champanhe e três copos.
– Meu Deus! Demorei assim tanto tempo? – perguntou. – Juraria que demorei menos de cinco minutos e volto para vos encontrar quase aos murros. Surpreendes-me, pequenina. Não o esperava de ti – disse a Suki.
Ela abanou a cabeça.
– Garanto-te que não…
– Estava a deixar algumas coisas claras à tua namorada – interveio Ramón.
Luis arqueou as sobrancelhas e desatou a rir-se.
– A minha namorada? De onde tiraste essa ideia?
Ramón relaxou levemente o queixo antes de encolher os ombros.
– Queres dizer que não é?
Suki cerrou os dentes.
– Podiam parar de falar de mim como se não estivesse aqui?
Ramón ignorou-a e ficou a olhar para o irmão, à espera de uma resposta. Luis pousou os copos e a garrafa na mesa para se sentar à frente deles.
– É como uma irmã para mim e preocupo-me com ela – respondeu Luis. – É minha amiga e, como amigo dela, considero-me no direito de dar um pontapé no rabo de quem tentar magoá-la. É…
– Está bem, está bem, entendi – interrompeu Ramón.
– Bom. Fico contente por o termos esclarecido – redarguiu Luis.
Suki virou a cabeça para Ramón.
– Ficou claro? – perguntou.
Ramón esboçou um sorriso, como