Hannah apoiou as mãos no colo e se virou para olhar para a janela. Ela teria que arrumar uma forma de convencê-lo a não contar o que ela tinha feito para Seth. Mas como? A carruagem entrou em movimento, os cascos dos cavalos batiam sobre os paralelepípedos.
– Vou me certificar de que a senhorita entre em segurança, então vou falar com o seu irmão.
Hannah olhou para Ramsbury com atenção.
– Isso não é necessário. Não tenho dúvidas de que haja algo que eu possa fazer para convencê-lo a mudar de ideia. – Ela baixou os cílios e fez beicinho. – Por favor?
– Fazer beicinho não vai levá-la a lugar algum comigo, mocinha. – Ramsbury ralhou. – Nem implorar irá. Poupe as suas forças.
– Então talvez eu possa argumentar com o senhor? – Ela se lançou para o outro lado da carruagem, para se sentar ao lado dele. – O senhor não pode me culpar por eu ter ido assistir o Talon. Ele é uma lenda e não jogava há anos. – Ela se inclinou para poder olhá-lo nos olhos e a sua coxa roçou na dele. – Aposto que o senhor foi lá pela mesma razão.
– A senhorita não pode comparar as minhas ações com as suas.
– Não posso? – Ela ergueu uma sobrancelha, questionando.
– Com certeza não. – Ramsbury franziu a testa. – Eu sou homem e sou capaz de me proteger.
Hannah levou a mão ao cinto e pegou uma pequena pistola que tinha escondido ali.
– Eu também vim preparada.
O verde dos olhos dele se aprofundaram enquanto ele a olhava, incrédulo.
– Blackford sabe que a senhorita tem uma pistola?
– É claro – Ela disse como se cada dama da ton possuísse uma.
Ramsbury tomou a arma dela e a virou em suas mãos grandes.
– Onde a senhorita a conseguiu?
– Meu pai a deu a mim antes de morrer. – Hannah sorriu, bastante feliz consigo mesma por tê-lo chocado. – Ele estava me ensinando a atirar.
Ramsbury voltou a olhar para ela e um calor inesperado atravessou o corpo de Hannah. Havia surpresa no olhar dele, mas ela apostava estar vendo também um toque de admiração. Talvez ela estivesse chegando a algum lugar?
– A senhorita aprendeu? – Ramsbury passou um dedo pelo cabo de marfim.
– Devolva e eu mostrarei – Hannah disse, erguendo a mão para a arma.
Ramsbury puxou a mão, deixando a pistola fora do alcance dela.
– Não atirará em mim esta noite, sua harpia. – Ele riu.
Hannah também não pôde deixar de rir.
– Creio que poderíamos ser amigos.
Ele ficou sério, a expressão ficando dura como pedra.
– Duvido muito.
– Sério? Por que eu não. – Hannah passou as mãos nas coxas, alisando a calça. – O senhor procuraria, em algum lugar do seu coração, uma forma de guardar o meu segredo? Só dessa vez?
Ele começou a balançar a cabeça na horizontal, mas ela continuou falando.
– Vamos lá, Ramsbury, o dano já foi feito. Que bem faria me dedurar agora? – As linhas no rosto dele se suavizaram enquanto os olhos ficavam pensativos. Encorajada, Hannah prosseguiu: – E se eu jurar que ficarei longe do Seven Dials?
Ramsbury esfregou a mandíbula com a palma da mão.
– Não faça eu me arrepender dessa decisão.
Ela sorriu, um peso considerável tinha saído de cima de seus ombros.
– Então o senhor não vai contar para o Seth?
– Guardarei silêncio sob duas condições. – Ramsbury colocou a pistola ao lado dele sobre o assento de couro, mas os dedos ainda seguravam o cabo. – A primeira é a senhorita prometer que ficará longe do Seven Dials e a segunda é que eu possa levá-la em segurança para casa.
– Feito. – Hannah olhou pela janela. – Vejo que já estamos prestes de cumprir a segunda, e o senhor tem a minha palavra quanto à primeira.
Ramsbury entregou a arma para ela.
– Por que será que estou com a sensação de ter acabado de fazer um pacto com o diabo?
Hannah gargalhou enquanto colocava a pistola de volta na calça.
– Não vá até a entrada de veículos. Posso ir caminhando daqui.
– Mas é claro que não. – Ramsbury sacudiu a cabeça.
Hannah olhou para ele com os olhos arregalados.
– Se o senhor for até lá, Seth pode nos ver. E como irá explicar a situação?
– Maldição. – Ramsbury franziu o cenho enquanto batia no teto da carruagem, sinalizando para o condutor parar o veículo. – A senhorita já está fazendo com que eu me arrependa da nossa barganha.
Hannah se levantou e foi até a porta.
– Pare de se afligir. Eu dei a minha palavra. – Ela abriu a porta e saltou da carruagem.
Ramsbury a seguiu um segundo depois.
– O que o senhor está fazendo?
Ele a pegou pelo cotovelo e deu um sorriso jovial.
– Vendo a senhorita entrar, como eu disse que faria.
Hannah olhou em direção aos fundos da casa, então olhou para Ramsbury.
– O senhor não pode estar falando sério.
– Ah, mas eu estou. Agora me diga como planeja entrar? – Ele olhou para a casa, depois olhou para ela.
Hannah soltou um longo suspiro, então disse:
– Subirei na árvore perto da minha sacada, então entrarei pela janela do meu quarto. – Ela deu um sorriso travesso enquanto segurava a lapela dele. – É óbvio que o senhor não pretende se juntar a mim.
– Não seja ridícula. – Ela deu um passo para trás, colocando distância entre eles. – Mas eu a acompanharei até a árvore e me certificarei de que a senhorita não quebre esse seu tolo pescoço enquanto sobe.
– Como quiser. – Hannah se virou e correu pelo gramado. Ela podia ter concordado com as condições, mas ela nunca disse que seguiria as regras dele. Ele teria que acompanhá-la caso pretendesse interferir ainda mais do que já interferira.
Chegando à árvore, Hannah agarrou o primeiro galho e se içou. Ela não se atreveu a olhar para baixo enquanto subia cada vez mais, alcançando o ponto mais próximo da sacada. Quando arriscou uma espiada, encontrou Ramsbury a encarando.
Ignorando-o, Hannah levou a mão ao rebordo de pedra que percorria toda a casa e se puxou para o pequeno passadiço que ele criava. Como queria poder ver a cara de Ramsbury agora. Infelizmente, não podia se atrever a afastar o olhar da sua precária posição. O rebordo não era largo o bastante. Tudo o que ela poderia fazer era passar sobre ele com as costas pressionadas na lateral da casa.
Ela se aproximou do balcão, então segurou o parapeito. Com o coração acelerado, Hannah se jogou na sacada. Ela se inclinou sobre a mureta e sorriu para Ramsbury.
– Está livre para ir, milorde.
Através da escuridão, ela mal podia dizer como ele era, mas as palavras dele alcançaram seus ouvidos com muita clareza.
– Nós não somos amigos.
As bochechas dela esquentaram. Por que as palavras dele a irritaram?
CAPÍTULO