â Por que você a matou? â Toya ordenou que sua voz fosse um assobio suave, mas cheia de raiva e desespero. â Você achou que, ao matá-la, ganharia o cristal? Nunca! Ela se recusou a dar-lhe esse poder e você ficou enfurecido. Não é, Hyakuhei? â gritou ele enquanto girava, tentando seguir seu inimigo enquanto Hyakuhei o rodeava com uma intenção mortal. â Não era segredo que você a queria para si â A mão de Toya apertou sua adaga com fúria quando se lembrou dos olhares assombrados, a perseguição, a visão do corpo dela sem vida. â Qualquer um poderia ver a maneira como você olhava para ela quando achava que eu ou o Kotaro não estávamos prestando atenção. â Sua respiração virou um soluço enquanto ele se moveu por um momento, sabendo que ele e Kotaro a amavam. Eles haviam lutado contra Hyakuhei e entre si por ela. Ninguém venceu. â Nós vimos você. Kyoko era minha e sempre será! â gritou Toya, enfurecido por perder aquela que ele amava mais do que o ar. Ela se foi. Ela tinha sido a luz na escuridão em que seu mundo se tornara.
Era a razão pela qual ele desafiava Hyakuhei. Agora, seu motivo para o desafio desapareceu e Toya sentiu o fogo em sua alma subir a uma temperatura fatal. Ele a encontrou sem vida, deitada com uma pequena adaga que atravessava seu coração. No fundo, ele sabia, ele e Kotaro sabiam. Hyakuhei de alguma forma a matou.
Os olhos negros de Hyakuhei tornaram-se mais escuros quando olhou com desprezo para o filho mais novo de seu irmão.
â Ah sim, o evasivo Cristal do Coração Guardião. Tal poder não pertence a uma criança tola como você. Os seres mais poderosos procuraram o Cristal do Coração Guardião. Achou que você era o único queridinho? Não só vampiros, mas também imortais e feiticeiros e até lobisomens compartilham desse desejo de reunir tanto poder.
â Não percebe o que aconteceria se o licantropo a tivesse reivindicado primeiro? â Os olhos de Hyakuhei sangraram carmesim ao pensar em Kotaro, lÃder das tribos dos licantropos, ganhando tal poder. Sua raiva aumentou quando ele lembrou o aroma do licantropo na carne dela nesta mesma noite. Ele não ficaria quieto e deixaria uma coisa tão traiçoeira acontecer.
â Não, menino imprudente, já cuidei da sacerdotisa que carregava o cristal dentro de si. â Os olhos de Hyakuhei se endureceram ao pensar na pequena mentira.
Na verdade, ele não havia matado a menina. Ela se suicidou para evitar que ele obtivesse o cristal. Ele a tinha ao alcance, pronto para reivindicar o poder que ela segurava dentro de si. O poder de que a lenda falava, se tal lenda pudesse ser levada a sério, teria permitido que a escuridão andasse dentro da luz e se alimentasse disso.
Seus dedos ainda formigavam devido ao toque brevÃssimo à pele dela. Ele estava parado atrás dela, sentindo o calor do corpo dela com sua mão fria. Seus olhos de esmeralda se viraram e se chocaram com os dele por um mero segundo, desafiando-o. Ele só queria ter um gostinho dela. Tarde demais, ele viu a adaga na mão dela quando desapareceu rapidamente em seu peito. Ele poderia tê-la transformado e compartilhado tudo com ela, mas ela recusou sua oferta generosa.
A corajosa, mas tola mulher acreditava que, ao se matar, ela bloquearia o poder do cristal do alcance dele para sempre. Para sempre foi um longo perÃodo de tempo para tentar se esconder dele.
â Ela vai renascer! â Toya gritou de angústia, sabendo que ele falhou em protegê-la da ira de Hyakuhei. Sua culpa por não estar lá para salvá-la estava devorando-o por dentro. Ela sabia que ele era um vampiro, uma criatura da noite e ainda assim não tinha dado as costas para ele. Ela já havia feito amizade com ele. Kyoko confiou a vida dela a ele.
A mente de Toya recuou ao tempo em que a conhecera... ele caiu de joelhos, se agarrando ao chão, observando suas lágrimas caÃrem. â Não foi tempo suficiente! â gritou silenciosamente em negação.
Só a conhecia por tão pouco tempo; seis ciclos da lua. Quando ele a conheceu pela primeira vez, ele só queria o cristal. O cristal que ela nem sabia que estava carregando no inÃcio. Mas ele podia vê-lo brilhando dentro dela, chamando-o. Então algo mudou. Toya se viu tentando protegê-la em vez de tirar o cristal dela.
Como ela tinha adentrado seu mundo sombrio, Toya encontrou a verdade por trás da lenda do Cristal do Coração Guardião, mesmo que Hyakuhei não percebesse. Ele queria contar os segredos ao seu irmão, mas Hyakuhei tinha impossibilitado o encontro dele com Kyou a tempo... agora era muito tarde.
â Você nunca terá a luz do cristal na escuridão. Vou encontrar Kyoko novamente e manter o cristal longe de você! â A voz de Toya era severa devido à necessidade de vingança. â Ela vai viver novamente e eu estarei lá esperando por ela â Uma única lágrima prateada deslizou despercebida pelo rosto enquanto ele gritava: â Juntos! Ela e eu encontraremos outra maneira de libertar Kyou de você!
Hyakuhei aproximou-se de Toya, uma risada sombria vinda do fundo do peito.
â Ah, sim, meu querido Toya, ela vai viver de novo. O cristal voltará a este mundo e eu serei o único a reivindicar não só seu poder, mas também a garota. Quanto ao meu precioso Kyou... estou certo de que posso encontrar algo para ocupar o tempo do seu irmão até esse dia chegar.
Toya rosnou sabendo que era uma faca de dois gumes.
â Guarde suas ideias doentias para si mesmo. Vou encontrar uma maneira de nos tornar normais de novo. E você... vou te fazer morrer! â ele terminou de falar em um grito enquanto o vento começou a ficar mais forte, uivando maliciosamente pela clareira.
O punhal em sua mão brilhou em um arco de luz prateada, mal agarrando a túnica escura que adornava o corpo de Hyakuhei. Toya não conseguia acreditar em quão rápido seu oponente era, mas seu rosto estava franzido com determinação. Uma segunda adaga apareceu em sua outra mão e ele a brandiu, seguida imediatamente pela primeira.
Hyakuhei se esquivou das lâminas mortais devido aos séculos de treinamento que ele já havia suportado. Os seres humanos eram criaturas tão fáceis de derrotar e Toya, embora transformado, ainda era muito humano em seu modo de pensar, ainda uma criança nos olhos de um vampiro.
Ele admitiria que de alguma forma, a proteção de Toya à sacerdotisa tinha envelhecido o poder deste para quase o mesmo nÃvel de um vampiro antigo. Levar a sacerdotisa para longe dele serviu dois propósitos. Sem um motivo para lutar, o poder de Toya diminuiu muito.
A mão esquerda de Hyakuhei atacou, de alguma maneira prendendo os dois pulsos de Toya em um aperto esmagador. Toya não conseguiu se defender quando as garras do vampiro cruelmente laceraram seu rosto.
Os olhos prateados se chocaram com os carmims por um momento suspenso no tempo, enquanto Hyakuhei retraÃa suas garras. Seus lábios insinuaram um sorriso corrompido enquanto ele esticou a mão para acariciar suavemente a ferida que ele acabara de causar tão cruelmente.
â à uma pena estragar esta perfeição. à muito parecido com seu irmão. â Ele lambeu de seu dedo as gotas de sangue recém-derramado antes de acrescentar: âMas eu não posso deixar seu amor rebelde distraindo Kyou de mim.
Sentindo seus pulsos serem liberados, Toya deu um passo para trás e tentou bloquear o próximo ataque vindo em direção do seu torso. Ele resmungou de dor quando o sangue derramou dos cortes feitos no seu peito. Pressionando um braço nas feridas, seus olhos dourados se arregalaram quando ele cambaleou para trás e, desta vez, Hyakuhei o deixou.
Toya podia sentir os ossos quebrados em seus pulsos se esmagando uns contra os outros e teve que