– Não conhecia Crystal – respondeu ele finalmente, enquanto coçava a barriga de Jolie. – Pelo menos, não a conhecia bem. Tony Valenti era o meu amigo. Trabalhávamos juntos.
– O pai dos gémeos?
– Sim.
– Também era militar?
– Sim – fez uma breve pausa. – Salvou-me a vida.
– Estou a ver – sim. E a coisa não tinha bom aspecto. Sullivan era um homem honrado e sentia-se obrigado a cuidar dos gémeos porque o devia ao seu amigo.
Uma hora mais tarde, os bebés já tinha tomado banho, já estavam vestidos e já tinham jantado. Rachel deixou Jolie no parque e deu-lhe alguns blocos de plástico. Tinha de admitir que mais duas mãos tinham feito com que as coisas fossem muito mais fáceis. E mais rápidas. Ela teria demorado quase o dobro do tempo a fazer tudo.
Virou-se para o sofá, onde Sullivan estava sentado, com Cody. O menino olhou para ele e sorriu, mostrando dois dentes. O homem passou-lhe um dedo pela face e pô-lo de joelhos.
Cody agarrou-lhe numa madeixa de cabelo.
Sullivan soltou-se com cuidado.
Dar-se-iam bem muito depressa.
Rachel cruzou os braços, não queria admitir que a imagem lhe parecia enternecedora. Dirigiu-se para o lado oposto do sofá e começou a dobrar a roupa limpa que havia no canto.
– Quais são os seus planos com os gémeos? – perguntou.
Ele arqueou uma sobrancelha, surpreendido por ela ser tão directa.
– Planeei cumprir com o que o meu amigo me pediu e levá-los para San Diego para que cresçam lá.
Rachel sentiu um aperto no coração ao ver os seus piores receios confirmados.
– Está bem. E eu?
– Muito simples. Espero que renuncie à custódia.
– Simples? – Rachel quase se engasgou ao repetir a palavra. – Como pode dizer que é simples com esse bebé ao colo?
Ele franziu o sobrolho e mudou o bebé de posição. Cody deitou a cabeça para trás e olhou para a cara deles. Os dois voltaram a comunicar-se em silêncio.
Depois, Sullivan olhou para Rachel.
– Entendo que não seja fácil para si. Mas é o melhor.
– Não entende nada. Falhei uma vez à minha irmã. Não voltarei a falhar. Quando morreu, o seu último desejo foi que eu criasse estas crianças. E é o que vou fazer.
Ele continuou a olhar para ela e, depois, inclinou a cabeça.
– A sua irmã nunca quis que os criasse.
Rachel deitou a cabeça para trás e, depois, para a frente, como se lhe tivessem dado um murro no queixo. Se Sullivan lhe tivesse batido, não a teria magoado mais.
Rachel sentiu uma culpa que tinha origem no passado, mas obrigou-se a afastá-la da sua mente. Crystal e ela tinham deixado o passado para trás quando os seus pais tinham falecido, há três anos, e Crystal fora viver com Rachel. Quando Crystal fora estudar para a Universidade de San Diego, tinham continuado em contacto por telefone e correio electrónico.
Rachel era a única família que Crystal tinha. Apesar do cansaço da semana anterior, Rachel sempre acreditara que a sua irmã queria que ela tratasse de Jolie e Cody.
Esfregou os braços, como se tivesse frio, mas quando percebeu que Sullivan a observava, cerrou os punhos e pô-los ao lado do corpo.
– Como pode dizer algo tão horrível? – perguntou.
– Eu só sei o que Tony me contou. Crystal não queria que ele nomeasse um tutor sem a consultar, foi por isso que a nomeou.
– O que demonstra que queria que eu criasse os seus filhos – replicou ela, ficando mais tranquila.
– Não. Não se ofenda, mas Tony não queria que alguém que fugisse da vida e das responsabilidades e que não fosse capaz de manter uma relação cuidasse dos seus filhos.
Rachel quis desmentir aquilo. Não podia acreditar que aquilo estivesse a acontecer. Mas era real. Ele estava ali, na sala dela, e não ia fazê-lo mudar de opinião.
– Não acredito. E se é uma brincadeira, parece-me de muito mau gosto.
– Não é nenhuma brincadeira – ele hesitou. Era evidente que tinha informação que não queria partilhar com ela. – Isso seria cruel. Ouça, eu pertenço a uma família muito numerosa e unida e Tony fazia parte dela. Ele queria que os gémeos também tivessem esses laços de união.
Sullivan baixou-se para recuperar o seu casaco e tirar alguns papéis. Estendeu-os a Rachel.
– Trouxe alguns documentos para assinar, para me ceder a custódia.
Contrariada, Rachel olhou para os papéis que lhe oferecia. Não queria pegar neles, não queria pensar que tinha razão a respeito dos motivos da sua irmã para a nomear como tutora, mas que aprendera há muito tempo que não servia de nada enganar-se.
Nem tentar evitar a realidade.
Ele olhou em seu redor e, depois, olhou para ela nos olhos.
– É evidente que a situação está fora do seu controlo – comentou.
– Isso é ridículo! – defendeu-se ela, ignorando os papéis e segurando nos babetes das crianças. – Não está fora do meu controlo. Só preciso de um pouco de tempo para me habituar.
Ele levantou-se e deixou Cody ao lado de Jolie, no parque.
– E enquanto se habitua, as crianças sofrem.
Rachel sentiu que a raiva que estava a conter desde que abrira a porta começava a bulir no seu interior. Pôs as mãos na anca e olhou para ele, indignada.
– Como se atreve? Não sofreram. Estou um pouco atrasada nos trabalhos da casa. E então? Apanhou-me num mau dia. Costumo arrumar quando estão a dormir, mas ontem à noite tinha de escrever. Tinha de fazer uma entrega.
Ele apontou para a sala desarrumada, os olhos azuis brilhavam de impaciência.
– Isto está aqui acumulado há mais de um dia. Torne as coisas fáceis para os dois. Renuncie à custódia e não terá de se habituar, não terá de andar atrás deles a arrumar.
– Basta! – Rachel não aguentava mais.
Entrou no seu quarto e pegou no saco das fraldas. Foi ao fraldário e arrumou fraldas, dois pijamas, um pacote de toalhetes e o leite em pó para o biberão no saco.
– Acha que pode fazer melhor do que eu? – perguntou, passando ao lado de Sullivan, a caminho da cozinha.
– Acho que é melhor acalmar-se – respondeu ele, com tanta calma que Rachel ficou ainda mais nervosa.
Ela abriu a porta do frigorífico e suspirou ao sentir que a unha do dedo polegar ficava presa e se partia. Os seus olhos encheram-se de lágrimas, mas conteve-as. Não queria mostrar nenhum sinal de fraqueza à frente daquele homem frio que a observava e que julgava todos os seus movimentos.
– Estou tranquila – declarou, arrancando a unha partida e pondo o dedo na boca enquanto segurava a porta do frigorífico com a anca, tirava dois biberões e os punha no saco das fraldas.
Dirigiu-se para ele e pôs-lhe o saco nos braços.
– Estou lindamente!
Foi até ao parque, pegou em Jolie ao colo. Agarrou em duas mantas e tapou-a com uma delas. Depois, atirou a outra a Sullivan, que olhava para ela com receio.
– Traga Cody.
– O que está a acontecer aqui,