no ímpeto da carreira,
perfumar-se e abrandar-se à viração!…
Partir, com o íntimo esforço, velozmente:
ver na campina a última leira,
rasgada pelo último arado,
aberta a boca mansa, esperar a semente!…
Partir, ouvindo os passarinhos,
que despertara a cotovia,
musicar, lado a lado,
o êxtase florescido dos caminhos!…
Ó! como é bom partir, subindo!…
Sob a palpitação da madrugada fria,
à ovação triunfal do dia infante e lindo
ó! como é bom partir subindo!…
Partir, alimentando um desejo de escol;
partir, subindo pelo espaço para o sol!…
Mas na suprema glória de subir,
sentir
que as forças vão faltar:
e retornar de novo para a terra;
e servir de instrumento numa guerra;
e rebentar,
e assassinar!…
Primavera
Fora desmantelado,
quando, golfando pela fauce aberta
o atestado dos órfãos e das viúvas,
um grande obus lhe rebentara ao lado…
No modesto recanto do jardim
da aldeia miserável e deserta,
na sua herança má de mudo e eterno,
estático e sem fim,
viu, no outono, morrer o sol das chuvas,
entrajou-se de neve em pleno inverno;
e agora, à sussurrante primavera
mostra no beiço o riso do jasmim…
Converteu-se. Sorriu à natureza;
perdoou a rabugice ao vento sul;
e, no êxtase imortal – Santa Teresa
da primavera – ele olha esperançosamente,
essa visão seráfica e esplendente,
a claridade mágica do azul…
Na culatra soaberta, onde altos estampidos
gerara a bala estrepitosa e fera,
fizeram ninho as andorinhas…
Culatra! – geradora de gemidos,
geradora de implumes avezinhas!…
Cobre-lhe uma roseira o desnudo cinismo.
Tem a benção do luar, nas noites perfumosas.
Vem ungi-lo às manhãs o sol de abril.
E o canhão convertido, odorante e gentil,
na imota unção de seu catolicismo,
ouve o Te Deum das abelhas sobre as rosas…
Espasmo
Ele morre. E tam só! Move-se e chama.
Quer chamar: sai-lhe a voz quase sumida;
e pelo esforço, sobre o chão de grama
jorra mais sangue da ferida…
Vai morrer… Angustiado, a noite inteira,
– noite encantada dum estio morno –
viu o tempo seguir entre as horas caladas;
nem percebeu a Lua cálida e trigueira,
com mil clarões afuzilando em torno;
e o broche colossal das estrelas douradas!
Olha agora. A alvorada
começa de brilhar nos longes glabros.
Perto, galhos de arbustos sonolentos,
onde a luz se dissolve na orvalhada,
são como verdes candelabros,
confortando-lhe os últimos momentos…
Estira os braços… Os odores,
em revoada puríssima e louçã,
sobem, cantantes, multicores,
cheios da força nova da manhã…
Ele pudera ouvir, caindo,
quando o estilhaço lhe rasgara o abdômen,
as joviais ovações dos seus soldados,
e, na fugida, os inimigos dizimados,
e os seus, em fúria, os perseguindo…
– E não restara um homem.
Depois, reviu os seus, a procurá-lo,
– altos lamentos pela noite clara…
Por pouco o não pisara
a pata dum cavalo!
Quis gritar, mas não pôde. E, único gesto
que abriu, foi um desfiar de lágrimas, silente;
e, olhos febris, rosto congesto,
viu seus ulanos
partirem tristes, tristemente…
E os passarinhos riem desumanos…
Sobem aos ares os primeiros hinos,
num triunfal e transbordante surto;
e em cima dele, com seus pios cristalinos,
libra uma cotovia o vôo curto…
Vai expirar. Já, numa ardência louca,
sente a sede da febre que o acabrunha…
Vai expirar… Mas só o estio o testemunha,
e a abelha matinal que lhe zumbe na boca…
E Gretchen? a rosada companheira
de dez meses apenas! e o filhinho
que está para nascer por esses dias?…
– Tantas quenturas de lareira!
tanto aconchego de seu ninho!
tanto amor! tantas alegrias!…
Principiavam ao longe os roncos e os estouros…
Vincou desoladoramente a fronte.
Morreu sozinho. Mas o sol, lá do horizonte,
pôs o espasmo da luz nos seus cabelos louros.
Guilherme
Ser feliz é ser grande. Imenso de alma,
inda que o corpo se lhe dobre…
É alcançar a região etérea e calma,
onde a alma viva enfim, nua e desimpedida…
Indiferentemente
ou sendo rico, ou sendo pobre,
ser feliz é encontrar no fim da vida,
de torna-viagem para a povoação,
a inflexível consciência, e encará-la de frente:
e ajoelhar para a coroação.
Ser grande é ser bom. Justo
na maneira de agir e no discernimento…
Não é apenas plagiar Alexandre