Uma maneira diferente de ver e considerar a vida, preferia as grandes cidades, onde era fácil acessar todos os serviços em minutos. Eu nunca tinha pensado que alguém pudesse viver em um lugar tão peculiar.
Levantar-me pela manhã e ver tudo isso parecia bastante inusitado e confuso; não me imagino viver desde criança ali, seria como estar permanentemente em um museu, sabendo que tudo o que tocasse tinha centenas de anos.
Mesmo que em relação às pessoas as diferenças entre nós não fossem tantas, no entanto, alguns nos olhavam com cara de estranheza, de desconfiança, o que nos fazia sentir como estrangeiros ali, quase como uma força de ocupação.
Talvez fosse apenas impressão, pode ser porque estivéssemos vestindo roupas diferentes daqueles que estávamos acostumados a ver por lá.
O que quer que seja, com o desgosto do furto que havíamos sofrido durante a manhã, andávamos com o cuidado de que não se produzisse nenhum outro desentendimento ou problema parecido, sabendo que agora éramos menos.
Talvez nossa viagem tenha sido muito precipitada devido às circunstâncias sócio-políticas do momento, mas era um sinal de boa vontade por parte do nosso colégio, uma demonstração de cooperação e troca.
Não sei se algum grupo de estudantes italianos iria visitar nosso país, suponho isso, mas minha informação não chegava a tanto.
Talvez fosse parte de uma política de abertura com o resto do mundo, não sei, o que estava claro é que nunca tinha visitado o país e que era uma grande oportunidade para fazê-lo, por isso não queria que nada nem ninguém me atrapalhasse.
Se o colega que teve a sua carteira roubada tivesse me dito a quantia que lhe faltava, eu mesmo a teria desembolsado para poder continuar com tranquilidade aquela excursão.
Não imagino que outro elemento de valor poderia ter nela, já que toda a documentação tínhamos guardada na embaixada. Aqui, para nos movermos pela cidade, tinham nos fornecido uma ficha na qual vinham nossos dados, o endereço do hotel onde estávamos hospedados e o telefone da embaixada. Apesar de estarmos em plena primavera recém-chegada, fazia bastante calor e não estávamos acostumados a temperaturas tão elevadas nessa época do ano, e era difícil para nós encontrarmos fontes para beber.
Das que havia, não estávamos seguros de que fossem potáveis, apesar de que as pessoas dali bebiam sem nenhuma preocupação, mas nós, por prudência, preferimos apenas refrescar as mãos e a cabeça, pois uma fonte que tem funcionado há tantas centenas de anos, não pode estar tão limpa quanto gostaríamos.
Talvez fosse diferente, mas aquelas pessoas nos pareciam bastante inocentes, longe das grandes cidades cheias de fumaça das fábricas próximas, à qual estávamos acostumados, mas algo parecido deviam pensar de nós, quando nos fascinávamos com os detalhes que eles contemplavam todos os dias.
Gostávamos tanto do que víamos, que alguns de meus colegas para não esquecerem, se dedicavam a recordá-lo em seus cadernos de desenho, preenchendo-os com a forma mais ou menos traçadas dos edifícios mais significativos e importantes. Outros, pelo contrário, parece que lhes ia melhor a escrita e paravam em cada rua tentando relatar, em alguns parágrafos, aquela maravilha que víamos. Apenas alguns colegas conseguiram trazer câmeras fotográficas.
Não sei como eles teriam passado pela alfândega, porque nos tinham dado instruções concretas antes de partir de que não poderíamos tirar nenhuma tecnologia de nosso país, mas suponho que o sobrenome dos pais desses colegas pesasse mais do que qualquer outra norma escrita.
De vez em quando eles nos pediam que parássemos para tirar algumas fotos em que aparecêssemos todo o grupo e atrás o edifício em questão.
Talvez tenha sido mais inexperiente que o restante no quesito viajar, já que tinha trazido apenas um pequeno caderno de anotações, no qual pretendia reunir todo dia o que era mais importante sem tentar captar naquelas poucas linhas a admiração que a cidade despertava em mim a cada passo.
Um dos aspectos que me pareceram mais curiosos pelo contraste com o que conhecia, estava relacionado à maneira de vestir das mulheres. As mulheres mais velhas, usavam um lenço preto na cabeça e vestiam o mesmo tom. As jovens o faziam com cores discretas e lenços muito chamativos.
Acostumado a ver as do meu país maquiadas, com grandes saias rodadas, com mangas curtas onde se viam os braços e apenas algumas usando o lenço para um detalhe decorativo.
Além disso, parecia que havia uma clara diferenciação entre sexos quanto ao que se podia fazer ou não, de modo que os homens desfilavam pela rua em seus trajes que pareciam os melhores estilos, onde a maioria, quando não estava no trabalho, usava uma simples camisa devido ao calor predominante, mas era uma atitude um tanto estranha para nós, os homens pareciam ser os que mandavam na sociedade, enquanto as mulheres recatadas tentavam passar completamente despercebidas, como se não tivessem nada para demonstrar ou contribuir.
Aquilo me parecia bastante surpreendente, é como se todos tivessem ficado presos no tempo, me refiro à como se vestem, pois não acho que seja algo religioso, como acontece com os quakers, uma comunidade que tinha se isolado do mundo, mantendo sua cultura sem querer progredir, prova disso era a roupa que utilizavam que não estava muito longe da que víamos agora.
Bem, essas eram as minhas impressões naquele momento; com o tempo, chegaria a entender a cultura que estava vendo, e era tudo fruto da minha inexperiência, pois segundo me revelaram os colegas que haviam viajado pela Europa em outros momentos, dependendo do país que se fosse, havia costumes e maneiras de vestir totalmente diferentes.
Até o tratamento entre homens e mulheres era bem diferente dependendo do país onde se estivesse, então eles me falaram sobre a exuberância da mulher francesa, que exibia suas qualidades sem modéstia, assim não esperava que o homem fosse em sua busca, mas era ela quem escolhia aquele que lhe parecia mais galã.
Mesmo em outros lugares em que compartilhávamos uma cultura e um idioma em comum, pareciam ainda manter tradições muito características, ao contrário do que vinha acontecendo em nosso país há muito tempo; as mulheres ainda não tinham conseguido ter um nível suficiente de independência econômica e política, como na Inglaterra, onde ocorreram os primeiros movimentos para obter o sufrágio universal, ou seja, que as mulheres pudessem votar na eleição dos seus representantes legais e com isso as reconhecesse uma série de direitos que lhe equiparavam ao homem. Mas tirando o aspecto político, ainda havia muitas que não trabalhavam mais além dos setores minoritários e em suas casas.
Aquelas comparações não deixaram de me surpreender, parecia que essa parte do mundo evoluía mais lentamente do que pensava.
Pelo menos no meu país, um esforço importante tinha sido feito para compartilhar sua cultura com o resto, uma vez que tinha integrado à sociedade todos os emigrantes que nas últimas décadas tinham chegado provenientes de todos os países da Europa, refugiados políticos, acolhidos ou simplesmente familiares, que desta forma se reencontravam.
Muitos tinham vindo fugindo de um sistema político que não os convencia, outros procurando melhores condições de vida e oportunidades de trabalho, e todos foram acolhidos sem diferença de sexo, raça ou religião.
Em pouco tempo haviam assimilado a cultura do país sem perder a sua própria, por isso era difícil distingui-los nas ruas, nem nas escolas, nem nos locais de trabalho.
Talvez o que mais se destacasse fosse a cor de sua pele ou algumas fisionomias, mas como já havia tantos que estavam neste país há gerações e gerações, isso não era indicativo de nada.
O que sim eles mantinham como sinal de identidade, eram seus ritos e cerimônias ao casar-se ou despedir-se de seus entes queridos quando morriam, alguns dos quais havia assistido mais de uma vez, as primeiras por curiosidade e as demais por amizade.
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