Os trolls olhavam todos com medo e em silêncio enquanto Vesúvio segurava a sua alabarda, comprimindo-a e descomprimindo-a.
"E porque é que pararam aqui?", perguntou ele. "Porque é que não destruíram Escalon todo?"
Suves olhava para os seus homens e para Vesúvio com medo.
"Nós fomos parados, meu mestre", ele finalmente admitiu.
Vesúvio sentiu uma onda de raiva.
"Parados!?", ele retrucou. "Por quem?"
Suves hesitou.
"Aquele conhecido como Alva", disse ele finalmente.
Alva. O nome tocou profundamente na alma de Vesúvio. O maior feiticeiro de Escalon. Talvez o único com mais poder do que ele.
"Ele criou uma fissura na terra", explicou Curves. "Um desfiladeiro que não conseguíamos atravessar. Ele separou o sul do norte. Muitos de nós morreram a tentar. Fui eu que cancelei o ataque, que salvei todos estes trolls que tu vês aqui hoje. É a mim que deves agradecer por as suas preciosas vidas terem sido poupadas. Fui eu que salvei a nossa nação. Para isso, meu mestre, peço que me promovas e me deixes, eu próprio, comandar. Afinal de contas, agora esta nação procura em mim a liderança."
Vesúvio sentiu a sua raiva a crescer ao ponto de explodir. Com as mãos a tremer, ele deu dois passos rápidos, girou a alabarda largamente e cortou a cabeça de Suves.
Suves desabou no chão, enquanto o resto dos trolls olhava em choque e medo.
"Aqui está o teu comando", respondeu Vesúvio ao troll morto.
Vesúvio observava a sua nação de trolls com descontentamento. Ele patrulhava as suas fileiras de cima a baixo, olhando para a cara de todos, incutindo o medo e pânico em todos, como ele gostava de fazer.
Finalmente, ele falou, com a voz a soar mais como um rosnado.
"O grande sul encontra-se diante de vocês", bombardeou ele com a sua voz sombria, cheia de fúria. "Estas terras foram em tempos nossas, pilhadas aos nossos antepassados. Estas terras foram em tempos de Marda. Eles roubaram o que é nosso."
Vesúvio respirou fundo.
"Para aqueles que têm medo de avançar, eu vou recolher os vossos nomes e os nomes das vossas famílias e vou mandar torturar lentamente cada um, um de cada vez. Depois, mando-vos apodrecer nas profundezas de Marda. Aqueles de vocês que desejem lutar, para salvar as vossas vidas, para reclamar o que em tempos foi dos vossos antepassados, vão juntar-se a mim agora. Quem está comigo? ", gritou.
Ouviu-se uma grande aclamação, um grande estrondo nas fileiras, fila após fila, até onde ele conseguia, de trolls a erguerem as suas alabardas e a gritar o seu nome.
"VESÚVIO! VESÚVIO! VESÚVIO!"
Vesúvio soltou um grande grito de guerra, virou-se e correu para sul. Atrás de si, ele ouviu como que um estrondo de trovão, o retumbar de milhares de trolls a seguirem-no, o retumbar de uma grande nação determinada a pôr fim a Escalon de uma vez por todas.
CAPÍTULO NOVE
Kyra voava nas costas de Theon, correndo para sul através de Marda, voltando lentamente a si mesma enquanto deixava aquela terra de escuridão. Sentia-se mais poderosa do que nunca. Na sua mão direita ela empunhava o Bastão da Verdade, que emanava uma luz brilhante envolvendo-os a ambos. Ela sabia que era uma arma maior do que ela; era um objeto de destino que a enchia com o seu poder, comandando-a enquanto ela o comandava. Segurá-lo fazia com que o universo parecesse maior, fazia com que ela se sentisse maior.
Kyra sentia como se estivesse a empunhar a arma à qual ela estava destinada desde que tinha nascido. Pela primeira vez na sua vida, ela entendeu o que lhe tinha estado a faltar e ela sentia-se completa. Ela e o bastão, esta arma misteriosa que ela tinha recuperado do fundo nas terras de Marda, eram um só.
Kyra voou para sul, Theon, também. Este maior e mais forte debaixo dela, com a fúria e a vingança nos seus olhos a combinarem com as dela própria. Voaram sem parar, com as horas a passar. Finalmente, a escuridão começou a diminuir e o verde de Escalon tornou-se visível. O coração de Kyra acelerou ao ver a sua terra natal; ela nunca tinha pensado que a ia ver novamente. Ela estava com pressa; ela sabia que o seu pai, apoderado pelos exércitos de Rá, precisava dela no sul; ela sabia que os soldados Pandesianos atulhavam o território; ela sabia que as frotas da Pandesia estavam a encurralar Escalon pelos mares; ela sabia que algures lá em cima os dragões circulavam, também curvando-se para a destruição de Escalon; e ela sabia que os trolls estavam a invadir. Milhões de criaturas estavam a destruir a sua terra. Escalon estava encurralada por todos os lados.
Kyra pestanejou e tentou afastar do seu pensamento a lembrança terrível da sua terra natal completamente destruída, com enormes áreas em ruínas, escombros e cinzas. E, no entanto, ao agarrar o seu bastão com mais força, ela sabia que aquela arma podia ser a esperança de redenção para Escalon. Poderiam aquele bastão, Theon e os seus poderes salvar verdadeiramente Escalon? Poderia algo ido há tanto tempo, ser salvo? Poderia Escalon alguma vez esperar voltar a ser o que em tempos tinha sido?
Kyra não sabia. Mas havia sempre esperança. Isso era o que o seu pai lhe tinha ensinado: mesmo nas horas mais sombrias, quando as coisas pareciam tão difíceis, mesmo quando pareciam totalmente destruídas, havia sempre uma esperança. Havia sempre alguma faísca de vida, de esperança, de mudança. Nunca era absoluto. Nem mesmo a destruição.
Kyra voava sem parar, sentindo bem dentro dela o seu destino, sentindo uma onda de otimismo, sentindo-se mais poderosa a cada momento. Ela refletiu e sentiu que havia conquistado algo profundo dentro de si mesma. Ela lembrou-se de quando cortou aquela teia de aranha e sentiu que, ao fazê-lo, também tinha cortado algo dentro dela. Ela tinha sido forçada a sobreviver por conta própria e tinha conquistado os demónios mais profundos dentro de si. Ela já não era a mesma miúda que tinha crescido na Fortaleza de Volis; ela já não era a mesma miúda que se tinha aventurado em direção a Marda. Ela tinha regressado como uma mulher. Como uma guerreira.
Kyra olhou para baixo através das nuvens, sentindo a mudança de paisagem debaixo dela, vendo que tinham finalmente chegado à fronteira onde as chamas em tempos haviam estado. Ela examinou a grande cicatriz na terra. Movimentações lá em baixo chamaram a sua atenção.
"Mais para baixo, Theon."
Eles desceram pelas grossas nuvens e, como a opacidade se dissolveu, ela ficou feliz por voltar a ver a terra que tinha amado. Ela ficou emocionada ao ver o seu próprio solo, as colinas e as árvores que ela reconhecia, ao cheirar o ar de Escalon.
No entanto, ao olhar novamente ela ficou desolada. Lá em baixo, estavam milhões de trolls, inundando a terra, a correr para o sul de Marda. Assemelhava-se a uma migração em massa de animais, com o seu burburinho audível mesmo a partir dali. Ao ver aquilo, ela não sabia como é que a sua nação poderia resistir a tal ataque. Ela sabia que o seu povo precisava dela – e rapidamente.
Kyra sentiu o Bastão da Verdade a zumbir nas suas mãos e, em seguida, a fazer um assobio estridente. Ela sentiu que ele a chamava para a ação, exigindo que ela atacasse. Ela não sabia se estava a comandar o bastão ou se ele é que a estava a comandar a ela.
Kyra levou o bastão em direção ao chão e, ao fazê-lo, ouviram-se estalos que emanavam dele. Era como se ela estivesse a empunhar trovões e relâmpagos na palma da mão. Ela observou fascinada uma esfera de luz intensa que saía do bastão e corria na direção do chão.
Centenas de trolls pararam e olharam para cima. Ela viu a cara de pânico e de terror quando eles olharam para a bola de luz que, vinda do céu, descia na direção deles. Não tinham tempo para correr.
Seguiu-se uma explosão, tão poderosa que as suas ondas de choque abanaram Theon e Kyra mesmo a partir do solo. A esfera de luz bateu no chão com a força de um cometa a embater na terra. Ao produzir o seu efeito de ondulação, milhares de trolls caíram, achatados pelas ondas de luz cada vez maiores.
Kyra analisou o bastão em reverência. Ela preparava-se para golpear