Kyle.
Ele ajoelhou-se ao lado dela, com uma mão na sua testa. Quando ele lhe tocou, Kyra sentiu lentamente a sua ferida a ser curada, sentiu-se lentamente voltar a este mundo, como se ele desejasse que ela voltasse. Teria ela efetivamente visitado a sua mãe? Teria sido real? Ela sentiu como se tivesse sido suposto ela morrer, mas, de alguma forma, o seu destino tinha sido alterado. Era como se a sua mãe tivesse intervindo. E Kyle. O amor deles tinha-a trazido de volta. Isso e, como a sua mãe lhe havia dito, a sua própria coragem.
Kyra lambeu os lábios, fraca demais para se sentar. Ela queria agradecer a Kyle, mas a sua garganta estava muito seca e as palavras não saíam.
"Shh", disse ele, vendo o seu esforço, inclinando-se e beijando-lhe a testa.
"Eu morri?", conseguiu finalmente perguntar.
Após um longo silêncio, ele respondeu, com uma voz suave, mas, ainda assim, poderosa.
"Tu voltaste", disse ele. "Eu não te deixaria ir."
Era uma sensação estranha; olhando-o nos olhos, ela sentia como se o conhecesse desde sempre. Ela estendeu a mão e agarrou o seu pulso, apertando-o, tão grata. Havia tanta coisa que ela lhe queria dizer. Ela queria perguntar-lhe porque é que ele arriscaria a sua vida por ela; porque é que ele se importava tanto com ela; porque é que ele se sacrificaria para a trazer de volta. Ela sentiu que ele tinha, de facto, feito um grande sacrifício por ela, um sacrifício que, de certa forma, iria magoá-lo.
Acima de tudo, ela queria que ele soubesse o que ela estava a sentir agora.
Amo-te, ela queria dizer.
Mas as palavras não saíam. Em vez disso, uma onda de exaustão tomou conta dela e, quando os seus olhos se fecharam, ela não teve escolha senão sucumbir. Ela sentiu-se a cair num sono cada vez mais profundo, com o mundo a passar por ela. Ela perguntou-se se estaria a morrer novamente. Teria ela sido trazida de volta apenas por um momento? Teria ela estado de volta uma última vez apenas para dizer adeus a Kyle?
E, ao cair finalmente num sono profundo, ela podia jurar ter ouvido algumas últimas palavras antes de adormecer de vez;
"Eu amo-te também."
CAPÍTULO CINCO
O bebé dragão voava em agonia. Cada bater das asas era um esforço, lutando para se manter no ar. Ele voava há horas sobre o campo de Escalon, sentindo-se perdido e sozinho neste mundo cruel onde tinha nascido. Passavam-lhe pela mente imagens do seu pai moribundo, estendido, com os seus grandes olhos a fecharem-se, sendo esfaqueado até a morte por todos aqueles soldados humanos. O seu pai, que ele nunca tinha tido a oportunidade de conhecer, com exceção daquele momento específico da batalha gloriosa; o seu pai, que havia morrido a salvá-lo.
O bebé dragão sentiu a morte do seu pai como se fosse a sua própria. A cada bater de asas, sentia-se mais sobrecarregado pela culpa. Se não fosse por ele, o seu pai podia agora estar vivo.
O dragão voou, destroçado com tristeza e remorso pela ideia de que nunca teria a hipótese de conhecer o seu pai, para lhe agradecer pelo seu ato altruísta de valentia, por salvar a sua vida. Uma parte dele também já não queria viver.
A outra parte, porém, a arder em raiva, estava desesperada para matar os seres humanos, para vingar o seu pai e destruir a terra por baixo dele. Ele não sabia onde estava, mas sentiu intuitivamente que estava a oceanos de distância da sua terra natal. Uma espécie de instinto levava-o a voltar para casa; no entanto, ele não sabia onde era a sua casa.
O bebé voou sem rumo, tão perdido no mundo, a expelir chamas sobre as copas das árvores, sobre qualquer coisa que conseguisse encontrar. Rapidamente, ele ficou sem fogo, começando logo a perder altitude, a cada bater das duas asas. Ele tentou subir, mas descobriu, em pânico, que já não tinha forças. Tentou evitar uma copa de árvore, mas as suas asas já não o conseguiam levantar e ele foi diretamente embater nela, em sofrimento com todas as velhas feridas que não se tinham curado.
Em agonia, ele saltou e continuou a voar, com a sua elevação continuamente a diminuir à medida que ele perdia força. Pingava sangue, que caia como gotas de chuva. Estava fraco da fome, das suas feridas, dos milhares de lanças que lhe haviam espetado. Ele queria continuar a voar, para encontrar um alvo para a destruição, mas sentiu os seus olhos a fecharem-se, demasiado pesados para ele agora. Sentia-se a entrar e a sair da consciência.
O dragão sabia que estava a morrer. De certa forma, era um alívio; em breve, ele iria juntar-se ao seu pai.
Ele despertou com o som do crepitar das folhas e dos galhos a partirem-se e, ao sentir-se esmagado nas copas das árvores, finalmente abriu os olhos. A sua visão estava obscurecida num mundo de verde. Não mais capaz de se controlar, sentiu-se a cair, agarrou-se aos ramos e, de cada vez que o fazia, magoava-se mais.
Por fim, abruptamente, ficou preso entre os ramos no alto de uma árvore, muito fraco para lutar. Ficou ali pendurado, imóvel, com demasiadas dores para se conseguir mover, cada respiração a doer-lhe mais do que a próxima. Ele tinha a certeza de que ia morrer ali em cima, emaranhado nas árvores.
De repente, um dos ramos cedeu, ouvindo-se um grande estalo. O dragão caiu. Caiu de ramo em ramo, partindo-os, caindo uns bons cinquenta pés, até, finalmente, cair no chão.
Ficou ali, sentindo todas as suas costelas a estalar, expelindo sangue. Bateu uma asa lentamente, mas não conseguiu fazer muito mais.
Ao sentir a força da vida a ir-se embora, parecia-lhe injusto, prematuro. Sabia que tinha um destino, mas não conseguia entender qual era. Parecia ser curto e cruel, nascido neste mundo só para testemunhar a morte do seu pai e depois para morrer ele próprio. Talvez isso fosse o que era a vida: cruel e injusta.
Ao sentir os seus olhos a fecharem-se pela última vez, o dragão tinha a sua mente preenchida com um pensamento final: Pai, espera por mim. Eu vou ver-te em breve.
CAPÍTULO SEIS
Alec no convés observava o mar, agarrando a amurada do lustroso navio preto, como vinha a fazer há vários dias. Observava as ondas gigantes a rebentarem e a recuarem, erguendo o seu pequeno veleiro. Via a espuma a separar-se por baixo do porão, enquanto cortavam a água a uma velocidade à qual ele nunca antes tinha navegado. O navio deles inclinou-se e as velas ficaram rígidas com o vento, com os vendavais fortes e constantes. Alec estudava o navio com os olhos de um artesão, questionando-se sobre de que seria feito este navio; claramente era feito de um material não comum, elegante, que ele nunca antes tinha encontrado, o que lhes permitia manter a velocidade durante todo o dia e noite e manobrar no escuro para além da frota Pandesiana, para lá do Mar do Arrependimento e na direção do Mar de Lágrimas.
Ao refletir, Alec lembrou-se do quão angustiante esta jornada tinha sido, uma viagem através dos dias e das noites, nunca baixando as velas, as longas noites no mar negro repleto de sons hostis, do ranger do navio e de criaturas exóticas agitadas a pular. Mais do que uma vez ele tinha acordado com uma cobra brilhante a tentar embarcar no barco e o homem com quem navegava a pontapeá-la com a sua bota.
Mais misterioso que tudo, mais misterioso do que qualquer exótica vida marinha, era Sovos, o homem ao leme do navio. Este homem que tinha procurado Alec fora na forja, que o havia trazido para este navio, que estava a levá-lo para algum lugar remoto. Alec não sabia se havia de ser louco e confiar naquele homem. Até agora, pelo menos, Sovos já o tinha salvado. Alec recordava-se, olhando de volta para a cidade de Ur quando estavam longe no mar, sentindo-se angustiado, sentindo-se impotente, ao testemunhar a frota Pandesiana a aproximar-se. Do horizonte, ele tinha visto as balas de canhão a romperem pelo ar, tinha ouvido o barulho distante, tinha visto a derrocada dos grandes edifícios, edifícios estes onde ele próprio tinha estado apenas algumas horas antes. Ele havia tentado sair do navio, para ajudá-los a todos, mas nesse momento, eles já estavam demasiado longe. Insistiu para que Sovos voltasse para trás, mas os seus apelos caíram em ouvidos de mercador.
Os olhos de Alec