Os Lusíadas. Luis de Camoes. Читать онлайн. Newlib. NEWLIB.NET

Автор: Luis de Camoes
Издательство: Public Domain
Серия:
Жанр произведения: Зарубежные стихи
Год издания: 0
isbn: http://www.gutenberg.org/ebooks/27236
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lhe eſtà do fado eterno,

      Cuja alta ley nam pode ſer quebrada,

      Que tenhão longos tempos o gouerno

      Do mar, que vé do Sol a roxa entrada.

      Nas agoas tem paſſado o duro Inuerno,

      A gente vem perdida & trabalhada.

      Ia parece bem feito, que lhe ſeja

      Mostrada a noua terra que deſeja.

      E porque, como viſtes, tem paſſados

      Na viagem, tam aſperos perigos,

      Tantos Climas & Ceos experimentados,

      Tanto furor de ventos inimigos

      Que ſejam, de termino, agaſalhados

      Neſta coſta affricana como amigos.

      E tendo guarnecida a laſſa frota,

      Tornarão a ſeguir ſua longa rata.

      Eſtas palauras Iupiter dezia,

      Quando os Deoſes por ordem reſpondendo,

      Na ſentença hum do outro difiria,

      Razões diuerſas dando & recebendo.

      O padre Baco, ali nam conſentia

      No que Iupiter diſſe, conhecendo

      Que eſquecerão ſeus feitos no Oriente,

      Se la paſſar a Luſitana gente.

      Ouuido tinha aos Fados que viria

      Hũa gente fortiſsimo de Heſpanha,

      Pelo mar alto, a qual ſojeitaria

      Da India, tudo quanto Doris banha:

      E com nouas victorias venceria,

      A fama antiga, ou ſua, ou foſſe eſtranha.

      Altamente lhe doe perder a gloria,

      De que Niſa celebra inda a memoria.

      Ve que ja teue o Indo ſojugado,

      E nunca lhe tirou Fortuna, ou caſo,

      Por vencedor da India ſer cantado,

      De quantos bebem a agoa de Parnaſo.

      Teme agora que ſeja ſepultado,

      Seu tam celebre nome, em negro vaſo,

      Dagoa do eſquecimento, ſe la chegão

      Os fortes Portugueſes, que nauegão,

      Suſtentaua contra elle Venus bella,

      Affeiçoada aa gente Luſitana,

      Por quantas qualidades via nella,

      Da antiga tam amada ſua Romana,

      Nos fortes corações, na grande estrella,

      Que mostrarão na terra Tingitana:

      E na lingoa, na qual, quando imagina,

      Com pouca corrupção cre que he a Latina.

      Eſtas cauſas mouião Cyterea,

      E mais, porque das Parcas claro entende

      Que ha de ſer celebrada a clara Dea,

      Onde a gente beligera ſe eſtende.

      Aſsi que hum pela infamia que arrecea,

      E o outro polas honras que pretende,

      Debatem, & na perfia permanecem,

      A qualquer ſeus amigos fauorecem:

      Qual Auſtro fero, ou Boreas na eſpeſſura,

      De ſilueſtre aruoredo abastecida,

      Rompendo os ramos vão da mata eſcura,

      Com impito & braueza deſmedida.

      Brama toda montanha, o ſom murmura,

      Rompenſe as folhas, ferue a ſerra erguida.

      Tal andaua o tumulto leuantado,

      Entre os Deoſes no Olimpo conſagrado.

      Mas Marte que da Deoſa ſuſtentaua,

      Entre todos as partes em porfia,

      Ou por que o amor antiguo o obrigaua,

      Ou porque a gente forte o merecia,

      De entre os Deoſes em pee ſe leuantaua,

      Merencorio no gesto parecia:

      O forte eſcudo ao collo pendurado,

      Deitando para tràs medonho e irado.

      A viſeira do elmo de Diamante,

      Aleuantando hum pouco, muy ſeguro,

      Por dar ſeu parecer ſe pos diante

      De Iupiter, armado, forte & duro:

      E dando hũa pancada penetrante,

      Co conto do baſtão, no ſolio puro:

      O ceo tremeo, & Apolo de toruado,

      Hum pouco a luz perdeo, como infiado.

      E diſſe aſsi, ò padre a cujo imperio,

      Tudo aquillo obedece, que criaſte,

      Se eſta gente que buſca outro Emiſpherio,

      Cuja valia, & obras tanto amaſte:

      Não queres que padeção vituperio,

      Como ha ja tanto tempo que ordenaste

      Não ouças mais, pois es juyz direito,

      Razões de quem parece que he ſoſpeito.

      Que ſe aqui a razão ſe não mostraſſe

      Vencida do temor demaſiado,

      Bem fora que aqui Baco os ſoſtentaſſe,

      Pois que de Luſo vem, ſeu tam priuado:

      Mas eſta tenção ſua, agora paſſe,

      Porque em fim vem de eſtamago danado.

      Que nunca tirarà alhea enueja,

      O bem que outrem mereçe, & o ceo deſeja.

      E tu padre de grande fortaleza,

      Da determinaçam que tẽs tomada,

      Nam tornes por detras pois he fraqueza

      Deſistir ſe da couſa começada.

      Mercurio pois excede em ligeireza

      Ao vento leue, & aa ſeta bem talhada,

      Lhe va mostrar a terra, onde ſe informe

      Da India, & onde a gente ſe reforme.

      Como iſto diſſe o Padre poderoſo,

      A cabeça inclinando, conſentio

      No que diſſe Mauorte valeroſo,

      E Nectar ſobre todos eſparzio:

      Pelo caminho Lacteo glorioſo,

      Logo cada hum dos Deoſes ſe partio.

      Fazendo ſeus reaes acatamentos,

      Pera os determinados apouſentos.

      Em quanto iſto ſe paſſa, na fermoſa

      Caſa eterea do Olimpo omnipotente

      Cortaua o mar a gente belicoſa:

      Ia la da banda do Auſtro, & do Oriente,

      Entre a coſta Ethiopica, & a famoſa

      Ilha de ſam Lourenço, & o Sol ardente

      Queimaua entam os Deoſes, que Tifeô

      Co temor grande em pexes conuerteô.

      Tam