Sete vítimas até agora, todas elas cortadas com precisão inquietante. Todas mulheres.
— Os patrulheiros deram uma boa olhada em você, minha querida. — disse Bernard, colocando o copo na mesa com um baque. — O que significa ser melhor ficar escondida até que o Açougueiro seja encontrado.
Ellie bebeu o gim como se fosse água, e o olhar dele se desviou para o brilho do líquido nos lábios dela, enquanto ela colocava o copo na mesa. Aqueles olhos brilharam com fogo que incendiaria as madeiras dos velhos edifícios abandonados. A mulher possuía uma beleza sobrenatural, algo mais selvagem e caprichoso do que qualquer coisa que ele encontrou. O que, é claro, garantia que ela era um problema destilado, e que ele deveria evitá-la como a escarlatina.
— Se estou ouvindo direito, parece que encontrar esse Açougueiro seria do nosso interesse. — disse Ellie. — Já fiz muitos inimigos nesta cidade, a última coisa de que preciso são os policiais marcando cada passo meu.
Bernard ergueu uma sobrancelha.
— Oh? Pode estar envolvida em atividades das quais não quer que os homens da lei saibam?
— Ora, vamos, negociei com um homem da lei como se você tivesse pelo menos um grama de inteligência. — respondeu Ellie, sem que seu sorriso nunca vacilasse. — Embora a escuridão possa absolver você de qualquer insanidade temporária que o tenha em suas garras. Afinal, a maioria de vocês não desculparia uma meliante apenas porque ela era inocente do crime de assassinato.
— Eu me desiludiria depressa da noção de que sou parecido com meus colegas. — respondeu Bernard.
A verdade que ela falava raspou em sua pele como cascalho. Ele cresceu nesta miséria e viu como essas ruas podiam ser feias. Razão pela qual, quando ele se tornou um detetive, se comprometeu a rastrear os piores indivíduos desta cidade, não aqueles que lutam para sobreviver.
Ellie cruzou os braços a frente do corpo, olhando para ele com um interesse que não se incomodou em esconder.
— Bernard Taylor, você é uma contradição enlouquecedora.
Ele tossiu na mão para esconder seu bufo.
— Apenas seguindo o exemplo da minha atual companhia.
As sobrancelhas de Ellie se juntaram, e a mandíbula cerrou como se estivesse processando uma ideia.
— Tudo bem, vamos trabalhar juntos.
Bernard se engasgou no meio de um gole de gim.
— E o que deu a ideia de que preciso de um parceiro? Em especial, uma com tantos passatempos detestáveis?
O peito dele batia um pouco mais forte com a audácia dessa mulher. Conhecer alguém tão ousado era um deleite raro.
— Se seus colegas fossem de muita utilidade, esse sujeito não teria assassinado sete mulheres. Além disso, está claro que está alguns passos atrás. Nesse ínterim, conheço essas ruas melhor do que qualquer patrulheiro, todos os becos escondidos, casas abandonadas que viraram mercado negro, e os cantos queimados onde o pior da cidade mora. O tom de Ellie não vacilou enquanto ela o encarava com uma confiança de que ele gostava.
Bernard apertou os lábios como se refletisse acerca da declaração. Verdade seja dita, ele vinha circulando pelos mesmos fatos há semanas. Se ela pudesse oferecer o mais leve sopro de uma nova direção, ele aproveitaria a oportunidade.
— Teríamos que trabalhar em segredo. — disse ele, lançando um olhar para ela. — Só à noite e tal.
Ellie puxou a ponta do rabo de cavalo e deu um olhar incrédulo.
— Como se eu fosse gostar de ser flagrada dando as mãos ao inimigo.
— Palavras das mais verdadeiras. — ele concordou, erguendo o copo de gim, ela ergueu o dela para tilintar contra o dele. — Então está combinado.
— Ellie Whitfield. — uma voz explodiu do outro lado do bar. — O que está fazendo deste lado da rua?
Um sujeito rude como uma lixa, sem alguns dentes, se aproximou com uma carranca e caneca em mãos, e algo nada agradável queimando em seus olhos. Os ombros de Bernard enrijeceram, as velhas disciplinas prontas para sua convocação.
— Maldição do cacete. — Ellie xingou, os pés alcançando o chão com um baque. — Fique alerta, Taylor. Estamos cara a cara com um dos homens mais covardes que terá a chance de conhecer na vida.
Ela bateu o copo vazio de gim na mesa e se levantou. A mão escorregou para o lado, de prontidão nas facas. Bernard seguiu a deixa, levando a mão à pistola.
Ellie gritou:
— Não tem mais ninguém para tornar miserável esta noite, James?
Ele se aproximou, alguns homens, que o seguiram pela porta, atrás dele. Com base nas expressões enfadonhas, e no balanço de seus grandes membros, o conhecido dela trouxe agressores com ele.
Ellie franziu os lábios e piscou na direção de Bernard.
— Sempre pode fugir agora se ficou assustado. Prometo conter meu escárnio.
Um sorriso apareceu nos lábios dele, um movimento de que ele se esquecera de que conseguia fazer. Ele balançou a cabeça e sacou a pistola.
— E perder este entretenimento desenfreado? Creio que não.
Capítulo Três
James Donovan era um rato-de-esgoto traidor da mais alta ordem. Ellie o vira pela última vez no trabalho que deveriam fazer juntos na casa de algum cavalheiro rico no extremo oposto da cidade. Ao menor sinal de problema, ele a abandonou junto do outro sujeito com quem trabalharam, e chorou bicas quando ele não recebeu sua parte. Em vez de culpar os dois, James decidiu colocar o peso apenas nos ombros dela.
E, claro, ele a encontrou agora. Tudo que Ellie queria era beber um pouco de gim e ficar um pouco alegre, secar-se após a fascinante noite que teve, fugindo dos policiais. No entanto, não importa o quão longe ela viajou por esta cidade apodrecida, o problema estava a um paralelepípedo de distância.
Bernard Taylor saltou da cadeira ao lado dela, uma prontidão na postura sugerindo que ele viu seu quinhão de brigas. Não que o colete e as calças fizessem muito para esconder sua figura musculosa, que ela notou poucos minutos depois que ele engatilhou a arma carregada na têmpora dela. O homem parecia mais um arruaceiro do que um detetive.
— Ellie, aonde pensa que vai? — James perguntou, os lacaios clamando ao lado dele. O ridículo cruzou os braços e formou uma carranca de bom tamanho, como se a pose pudesse fazê-la tremer nas botas. — Creio que me deva um pouco mais do que uma bebida. — o tom sugestivo da voz dele a fez querer vomitar.
— Eu bem sei o que merece, Donovan, e não é nada agradável. — disse Ellie, dando alguns passos para diminuir a distância entre eles.
Os fregueses do bar que não eram nada estúpidos pararam para olhar entre os dois, ninguém ousou se envolver. O aperto de Ellie aumentou em torno das facas. Ela não deixou de notar como James baixou as mãos. Com certeza, o desgraçado puxaria uma pistola.
Ellie captou o lampejo de cobre de trás das costas dele. Não era uma pistola, nem uma lâmina.
Ah, não.
Ela encontrou os olhos de Bernard.
— Quando eu disser, precisamos correr.
Porque James Donovan era um covarde idiota que havia levado uma bomba a um bar cheio de pessoas inocentes. O estilhaço da bomba destruiria a maior parte da multidão ali dentro. Donovan se aproximou, os companheiros o flanqueando atrás dele para bloquear a fuga deles.
Sem saída, a não ser para cima.