– Não deixas de te referir à criança como se fosse só tua, mas eu também participei na sua concepção, não foi? – Pascual tinha um nó na garganta e custava-lhe falar. – Porque não me contaste, na altura, como a tua experiência passada te afectava? Nunca devias ter ido embora sem falar comigo. Receber um bilhete no dia após a festa de celebração do nosso noivado e ler que te tinhas ido embora, foi mais do que terrível. Achei que estava a ter um pesadelo!
Pascual fixou o olhar no chão, recordando a dor que o perdera num abismo de desespero pela primeira vez na sua vida. Abanou a cabeça.
– Eu… Naquele momento, era-me difícil pensar bem – disse Briana. – Os preparativos do casamento tinham começado e cada dia tinha mais medo de estar a cometer um erro terrível… E para piorar tudo, houve o incidente com a tua ex-namorada.
– E não podias falar comigo sobre essas coisas? Não era um desconhecido, que não se importava. Supostamente, era o homem que amavas!
– Eras! Quer dizer, tu…
– Receio que as tuas explicações cheguem demasiado tarde, querida – estudou-a com o olhar. – Nada do que possas dizer-me agora fará com que recuperes a minha confiança e o meu respeito. O que fizeste esmagou todos os sentimentos que alguma vez tive por ti, transformando-os em pó e cinzas.
Pascual atravessou o quarto, tentando limpar a cabeça. A chuva batia com força nos vidros antiquados, como o eco da pressão que crescia no seu interior. Pensamentos, lamentações e sensações dolorosas assolavam a sua mente e o seu coração, ao ponto de mal conseguir suportá-lo. Mas entre todo esse tumulto, uma coisa dominava tudo o resto: Tinha um filho.
Ao recordar a paixão que o seu amigo Fidel sentira pelo seu único filho, dominou-o a determinação de resolver as coisas, pelo menos nesse sentido. Não estivera presente durante os primeiros quatro anos de vida do filho, mas estaria presente a partir daquele momento!
Virando-se para a figura solitária e esbelta que continuava parada no meio do quarto, rejeitou qualquer fugaz sentimento de piedade ou empatia. O que Briana dissera era verdade: As explicações tinham chegado demasiado tarde. O que acontecesse agora, seria causado por ela.
– Não quero continuar a falar do assunto esta noite. Preciso de tempo para pensar. Para mim, foi um grande choque descobrir que tenho um filho. E também o facto de saber que a sua mãe fria e egoísta decidiu que eu não tinha o direito de saber da sua existência. Falaremos novamente amanhã, depois do jogo de pólo. Tomarei então decisões importantes.
– As decisões sobre o futuro não dependem só de ti, Pascual!
– Se eu fosse a ti, Briana – disse, lançando-lhe um olhar furioso, – não me arriscaria a dizer nada sobre o assunto esta noite. Já fizeste as coisas à tua maneira durante demasiado tempo. Não permitirei que essa situação se prolongue e mais vale acreditares nisso!
Consciente de que, se continuasse no quarto com ela mais um segundo, se entregaria a uma explosão de raiva incontrolável, Pascual dirigiu-se para a porta. Saiu para o corredor escuro e não olhou para trás.
– Tiveste uma má noite?
O tom sempre risonho de Tina quase fez com que Briana desse um salto. Tinham-se encontrado para tomar o pequeno-almoço na cozinha, na manhã seguinte. Com os nervos em franja, serviu-se de uma chávena de café e lançou um olhar irónico à colega.
– Pode dizer-se que sim.
Levou a chávena para a robusta mesa de carvalho, afastou uma cadeira e sentou-se. Com ar ausente, acrescentou leite e açúcar à bebida. As suas olheiras revelavam que não dormira durante toda a noite. Que mulher teria conseguido dormir depois de Pascual a acordar, irritado, a meio da noite? Não conseguia parar de se perguntar, com ansiedade, que decisões importantes a respeito de Adán e dela é que Pascual tomaria.
Na noite anterior, estivera mais do que furioso e, em grande medida, ela aceitava merecer a sua condenação. Nunca devia ter-lhe escondido a existência de Adán, por muito que a assustasse que a sua vida futura se transformasse numa réplica da sua infância. A grande tragédia era que amara esse homem com toda a sua alma e, ao vê-lo novamente, compreendera que o seu amor por ele continuava vivo. Estivera adormecido, à espera de voltar a acordar.
Em alguns momentos, durante o confronto desagradável da noite anterior, Briana desejara aproximar-se de Pascual, suplicar-lhe perdão e perguntar-lhe o que podia fazer para o compensar. Mas não o fizera por medo do que ele pudesse exigir. Angustiava-a a ideia de ele pensar seriamente em tirar-lhe a custódia do filho e esse sentimento oprimia-a. Dada a sua riqueza e o poder da sua família, Pascual contava com os meios necessários para lhe tirar Adán. Briana não conseguiria evitá-lo de maneira nenhuma. Comparada com essa ideia inquietante, a ameaça de um julgamento por dívidas da sua empresa carecia de toda a importância.
Sem saber o que fazer, olhou para a chávena de café, observando as espirais de vapor que se elevavam da porcelana delicada. Sentia-se como se estivesse num túnel escuro, sem possibilidade de encontrar a luz no fim. Se o seu pai tivesse tido a capacidade de ser fiel à mãe, se tivesse posto o bem-estar da esposa e da filha acima do snobismo da classe e do dinheiro com que crescera, talvez Briana não tivesse acabado perdida na situação penosa que estava a viver com Pascual.
– O que se passa contigo, Bri? – Tina sentou-se à frente dela. O seu bonito rosto expressava preocupação genuína.
Briana, consciente do que a sua jovem amiga, involuntariamente, revelara a Pascual na noite anterior, sentia-se muito renitente a falar de assuntos pessoais. Tinha a certeza de que Tina não quisera fazer nenhum mal, mas mesmo assim não devia ter falado dela tão alegremente.
– Estou bem. Passei uma má noite, foi só isso.
– O nosso impressionante senhor Domínguez esteve a fazer-me perguntas sobre ti ontem à noite. Na verdade, cada vez que tentava mudar de assunto, dava-me a volta para falar de ti! Penso que gosta mesmo de ti, Bri.
– Tanto faz se gosta ou não. Estou aqui para fazer o meu trabalho, mais nada. E, no futuro, agradecer-te-ia se não falasses livremente das minhas circunstâncias pessoais. Sobretudo, com pessoas para as quais estou a trabalhar.
Tina, sinceramente surpreendida com a explosão de mau humor da sua chefe, nada habitual, encolheu os ombros com ar compungido.
– Lamento muito. Mas é um homem tão encantador… Antes de dar por isso, tinha-me sacado coisas que, normalmente, não contaria. Refiro aos problemas financeiros da empresa e à tua condição de mãe solteira…
– Aceito o teu pedido de desculpas. Mas, acredita em mim, se queres triunfar nesta empresa e na tua vida, terás de aprender a ser muito mais discreta! Vou acabar o café e depois começaremos a trabalhar. Se o senhor Domínguez te fizer mais perguntas sobre mim, diz-lhe para falar comigo, está bem?
Capítulo 5
Passara toda a noite a dar voltas à cabeça, pensando no que fazer. Finalmente, precisando de um pouco de ar fresco, saiu da casa que continuava silenciosa e, com as mãos nos bolsos, seguiu um dos caminhos serpenteantes. Começava a amanhecer e a névoa prateada cobria as árvores e sebes como um manto diáfano. O ar era tão frio que Pascual tremeu. Admitiu que o campo inglês, no Outono, era um presente para a vista. Os seus pés esmagavam as folhas douradas e húmidas contra o cascalho. Era o primeiro prazer verdadeiro que experimentava desde a sua chegada.
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