– Não, foi por isso que o meu irmão decidiu que o baptizado fosse durante as férias.
– Menina Dysart, posso perguntar-lhe uma coisa?
– Sim, claro.
– A senhora acha que a minha mãe continuará a gostar de mim da mesma forma, quando nascer o meu irmão?
– Garanto-te que sim, Abby. Eu tenho três irmãs e um irmão e a minha mãe gosta de nós da mesma forma.
A menina pareceu tranquilizar-se um pouco depois de ouvir aquilo e Kate decidiu que uma dose de televisão era o melhor para esquecer as preocupações.
Dispuseram-se a ver uma comédia, mas antes que terminasse soou a campainha. Era um homem alto, de ombros largos, cabelo loiro e expressão simpática.
– Boa noite, é aqui que vive a menina Dysart?
– Eu sou Katharine Dysart…
– Tio Jack!
– Desculpe ter chegado tarde – riu-se ele, tomando a menina nos braços. – Sou Jack Spencer. Falámos pelo telefone.
– Sim, claro. Entre, por favor.
– Agradeço-lhe muito por ter ficado com a minha sobrinha.
– Não foi nada. Estivemos muito bem, não foi, Abby?
A menina assentiu.
– Ajudei-a a ralar queijo para o jantar e depois vimos televisão. E o papá telefonou, mas disse que o bebé ainda não nasceu…
– Está bem, palradora. Depois contas-me. Vamos?
Enquanto Abby foi ao quarto de banho, Kate aproveitou a oportunidade para falar com Jack Spencer.
– Pensa que a sua mãe não vai gostar dela quando nascer o bebé. Talvez devesse comentá-lo com a sua irmã… já sabe, para falar com ela.
– Estes miúdos… – riu-se o homem. – Não se preocupe, assim farei.
– Obrigada.
Abby apareceu nesse momento.
– Obrigada por me ter dado de jantar, menina Dysart.
– De nada. Foi um prazer. Vemo-nos para a semana que vem no colégio.
Jack Spencer meteu a sua sobrinha no jipe e apertou o cinto de segurança.
– Muito obrigado, menina Dysart. Não sei o que faríamos sem a senhora.
– De nada. Posso pedir-lhe um favor?
– Claro.
– Importar-se-ia de me telefonar quando nascer o bebé?
Jack Spencer sorriu.
– Não sei se gostaria que a acordassem de madrugada. Será melhor que lhe telefone de manhã… supondo que o bebé tenha nascido.
– Assim o espero – sorriu Kate.
– A senhora é muito nova para ser professora, menina Dysart. É o seu primeiro trabalho?
– Não.
– Então deve ser mais velha do que parece… Bom, tenho que me ir embora. Obrigado outra vez.
Kate fechou a porta, pensativa. O tio de Abby não era o que tinha esperado. Imaginava-o mais jovem, mas parecia tão capaz de colocar azulejos e levantar cimento como qualquer um.
O telefone soou quando se ia deitar.
– Sim…? Ah! és tu, Alasdair.
– Desculpa desiludir-te. Parece que estavas à espera de outro telefonema.
– Não, não estava à espera de outro telefonema.
– A menina já se foi embora?
– O tio dela veio buscá-la há meia hora. E eu ia-me deitar.
– Tão cedo?
– Hoje foi um dia muito cansativo para os professores e depois tive que consolar uma miúda preocupada com a sua mãe – disse ela, sem a preocupação de dissimular um bocejo.
– Não queria roubar-te mais tempo, de modo que vou directo ao assunto. Que prenda compro para o bebé?
– Não tens que comprar nada. Adam não está à espera de nenhum presente.
– Disse-me que tu és a madrinha. O que é que compraste?
– Pedi-lhe que procurasse algo de prata antiga no antiquário do meu pai.
Kate esperou, sabendo que Alasdair tinha outra razão para lhe telefonar.
– Poder-nos-íamos ter encontrado depois, quando a menina se tivesse ido embora.
– A verdade é que não me dava jeito. Aliás, disseram-me que nos vamos ver no baptizado.
– Não te parece bem, não é?
– Não é assunto meu.
– Se não queres que vá…
– Porque não? Podemos falar dos velhos tempos – disse ela então.
– Eu esperava fazer isso esta noite. É verdade, estou de volta a Inglaterra definitivamente. Uma promoção.
Kate encolheu os ombros, mesmo que ele não a pudesse vê-la. Que Alasdair Drummond vivesse em Inglaterra ou nos Estados Unidos era-lhe indiferente.
– Parabéns. Descobriste alguma droga milagrosa?
– Mais ou menos. Conto-te quando nos virmos.
– Alasdair, deveria ter-te perguntado isto há mais tempo… De quem era o funeral a que foste esta tarde?
– Da minha avó.
– Ah, os meus pêsames.
– Obrigado. Podemos ver-nos amanhã, Kate?
– Não, desculpa. Vou para Stavely depois do almoço. Boa noite, Alasdair. Vemo-nos no Domingo…
– Não desligues, por favor. Se esperar até Domingo, não poderei ver-te em particular. E estou mais curioso do que nunca para resolver o mistério.
– Que mistério? – perguntou ela, apesar de saber de que é que ele estava a falar.
– Vá, Kate… tu sabes a que mistério me refiro. Eras a estudante de física mais brilhante de Cambridge. O que aconteceu para decidires desperdiçar o teu talento dando aulas numa vila isolada?
Capítulo 2
Kate conteve-se a muito custo.
– Olha, Alasdair, já falámos disto na última vez que nos vimos e a resposta continua a ser a mesma. Eu não penso que esteja a desperdiçar o meu talento. E Foychurch não é uma vila isolada. É uma comunidade com pessoas encantadoras, de modo que estou muito bem. Eu sou uma rapariga do campo, lembras-te?
– Lembro-me muito bem. É por isso que o que dizes não responde à minha pergunta. Os teus tutores de Cambridge pensavam que tinham encontrado uma nova madame Curie – recordou-se ele.
– Pois enganaram-se. E agora que esclarecemos isso, boa noite.
– Kate, escuta…
– Não quero ouvir. Boa noite.
Kate desligou e ficou a olhar para o céu escuro pela janela, inquieta e incomodada pelos comentários de Alasdair Drummond.
As suas irmãs mais velhas, Leonie e Jess, eram duas pessoas muito seguras de si mesmas. Como o seu irmão Adam. Mas Kate, três anos mais nova e muito menos extrovertida, tinha compensado a sua falta de confiança com uma grande ética profissional e um cérebro que lhe conseguiu lugar na Universidade de Cambridge.
E